Image Joanesburgo - De passagem pela Africa do Sul, o politico Filomeno Vieira Lopes foi solicitado, um dia antes das eleições sul africanas, a tecer o depoimento que se segue, tendo em conta a experiencia  da realidade angolana.

“O continente africano aguarda com ansiedade o processo eleitoral na Africa do Sul. Mais que os resultados os africanos querem estar confiantes que o processo conducente ao acto eleitoral e o acto em si sejam transparentes e nao envolvam a violencia. A grande preocupação dos cidadãos africanos e da africa austral em particular é que os actores políticos sejam capazes de credibilizar a democracia e que cada acto eleitoral represente um avanço na democracia, uma vez que é consesual que esta aumenta certamente os níveis de liberdade e cria condições para uma luta mais eficaz para o bem estar. Exemplos de eleições na República Democrática no Congo, no Zimbabwe, em Angola e mesmo em Moçambique não ajudam a criar um clima de estabilidade política democratica.

Na verdade os partidos no poder tudo fazem para controlar o processo eleitoral. E porque pretendem maiorias qualificadas para alterar a Constituição enveredam por meios fradulentos ou de pressão jogando todas as influencias de poder contra os restantes partidos. Em Angola, por exemplo, o OPSA – obvservatório politico social de angola – uma organização da sociedade civil, com uma composição pluralista, considerou as eleições em Luanda como “caóticas” apesar do Governo ter tido 7 anos e seis meses para preparar as eleições após o fim da guerra (quase três anos mais que uma legislatura) e ter utilizado todos os meios modernos para a realização das mesmas. O próprio orgão que deveria conduzir as eleições – CNE, Comissão Nacional Eleitoral -  em inquérito mandado realizar sobre o dramático falhanço logistico considera que houve enormes “irregularidades e insuficiencias”,  forçando as eleições a realizarem-se em dois dias, enquanto a lei bem como uma resolução saída da Assembleia Nacional propõe um dia e o partido no poder pretendia estender para dois.

Naturalmente que a situação do amadurecimento democrático na Africa do Sul não permite ter uma legislação dúbia e manipulável como em Angola, onde nem todas as regras estão definidas e se alteram as regras por vontade dos governantes com anuncios dois dias antes das eleições como aconteceu com o voto especial. A observância das recomendações da SADC na legislação sul africana é clara, enquanto que Angola seguiu uma via em que o orgão responsável pelas eleições é praticamente determinado pelo governo e mesmo assim as tarefas decisivas do processo foram directamente executadas por um orgão interministerial, fortemente apoiado por acções de inteligència.  Ninguém pensa que na Africa do Sul se realizem eleições sem cadernos eleitorais, sem recenseamento em tempo útil dos fiscais da oposição e sem se saber quem vai ficar nas mesas eleitorais. Estamos quase seguros que hoje todos os actores sabem exactamente quantos mesas haverão pelo país e que não haverão mesas suplementares fora das previstas. É provavelmente inimaginável que os militares, as forças policiais e de segurança  votem fardados e em filas massivas ou que muitos cidadãos votem à luz de candeeiro ou de velas, que o partido no poder  instrua os elitores na hora do voto para votarem porque “juntos faremos melhor” ou que as entidades tradicionais a si afectas exijam que todos aqueles da comunidade que vao votar devam passar por eles antes e depois do voto. Igualmente não pensamos que a oposição acompanhará o escrutínio numa sala onde um ecran anuncia pura e simplesmente o progresso da contagem. Mas apesar disto ter acontecido em Angola, outras coisas podem eventualmente ocorrer na África do Sul pois o medo de perder poder e o propensão de domínio pode obliterar a visão de que nas eleições, nos países de democracia nascente, o que está em primeiro lugar é mostrar a maturidade do sistema,  a idoneidade dos concorrentes e, sobretudo, a transparência da soberania popular.

Uma vez que compete sobretudo ao poder demonstrar o respeito pelas regras, competirá sempre a oposição velar para que as mesmas não sejam manipuladas. O mandato que o povo confere à oposição nesse sentido é não permitir qualquer abuso do poder que resulte em deturpação da sua soberana vontade. Por isto, a organização da oposição e a sua unidade, contrariamente o que aconteceu em Angola, para o controlo do processo e acto eleitorais é crucial para que as eleições sejam um elemento de consolidação do sistema democrático. É evidente que a oposição é díspara. Ostentou programas diferenciados na campanha mas é sempre oposição ao poder e seria contra ela que qualquer  manobra seria efectuada. Ora, é bom de ver que uma das grandes debilidades das deocracias africanas é exactamente o poder não saber lidar com a oposição, enquanto categoria indispensável e salutar à dinâmica da democria, uma vez que há uma grande lacuna no que respeita ao sentimento de partilha. Não restam assim dúvidas que a oposição deve fazer um importante exercício de imaginação para exercer de forma conjunta (independentemente da grandeza dum ou de outro protagonista) o controlo do processo, como ocorreu no Zimbabwe onde foi possivel uma contagem paralela atravéz do monitorização das actas que apanhou o poder desprevenido e permitiu discutir com base em provas a falsidade dos resultados.

Não  restam pois dúvidas que entre nós cada processo eleitoral é um exercício de defesa da democracia, contra a fragilidade das instituições e as tentativas de usurpar um poder não outorgado de facto pelo eleitorado. Não restam menos dúvidas que a Africa do Sul é muito importante no contexto africano para consentir que o seu sistema degenere. Há pois uma grande expectativa de que as presentes eleições possam demontrar isso mesmo e ser um exemplo inibidor das frequentes fraudes que vimos infelizmente assistindo pelo nosso continente afora.  A bola está pois do lado da oposição.”

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Joanesburgo, aos 21 de Abril de 2008
Fonte: Club-k.net