Ao Encontro do Conceito Neocolonização
 

Antes, entenda-se, aqui, por neocolonização o domínio económico, social, político, cultural e consequente exploração pela elite política no poder da grande maioria condenada a uma vida abaixo da linha de pobreza.

Seria tamanha desonestidade e injustiça comigo mesmo pôr em causa a dignidade de todo um esforço que custou suor e sangue a todos quantos se sacrificaram pela independência desde a primeira resistência desencadeada pelas comunidades sob orientação dos reis e sobas aos pais do nacionalismo angolano e anónimos. Contudo, seria absurdo ignorar, no período pós-independência, a falta de uma estratégia ou política adaptativa à nova racionalidade político-cultural. E, é aqui onde teríamos colocado a fronteira entre a racionalidade politica neo-colonial e a filosofia politica anti-neo-colonial. Por isso, a luta pela auto-determinação dos nossos povos, ainda, não está terminada. Ou seja, recebemos a nossa terra e corremos com o colonialista português, mas o fundamento ideológico-político quase ou nada mudou. Confira comigo:


Argumento de Razão 
 

Tal como na colonização, ainda hoje, é instrumentalizada a autoridade do poder tradicional que continua refém dos interesses e vontade arbitrária da classe que governa o país. Prova disso é que muitos sobas são nomeados e fardados como no tempo colonial fora dos padrões e valores culturais. Não é isso, porventura, que nos é dado a ver?
 

A terra não  é propriedade originária do povo, mas do Estado como no tempo colonial. Em resultado disso, o povo é excluído dos centros urbanos e condenado à periferia como no tempo colonial. As terras tradicionais que o colonialista português tinha brutalmente retirado às famílias comunitárias transformaram-se em Aldeamentos e Fazendas das elites políticas do país. Ou seja, o povo, em grande medida, não voltou às suas antigas terras e férteis. Muitas comunidades são forçadas a abandonar as terras por estarem dentro dos marcos das fazendas dos ex-colonos. As demolições, o uso da força e a não indemnização é a triste realidade que perpetua no tempo porque assim foi também no tempo colonial.
 

A luz eléctrica tal como no tempo colonial é ainda privilégio de alguns. Veja que mesmo no coração de Luanda conviver com a escuridão ou o batuque de geradores eléctricos é uma realidade. As casas de pau-a-pique e de latas nos Musseques resistem ao lado de imponentes residências de homens ligados ao poder que espalharam residências ou casas luxuosas para lá das nossas fronteiras. A casa de pobre passou a ser na linguagem dos feudocratas, casebre.
 

Com o potencial em recursos hídricos o país está sedento. Tal como no tempo colonial a água canalizada é só para alguns. A grande maioria não consome água potável. Em alguns Bairros soluçam chafarizes que jorram hoje e amanhã às moscas. Em Luanda as estradas andam engarrafadas pelas cisternas de água para abastecerem os tanques. Quer dizer que a grande maioria em Luanda não tem acesso a água potável.
 

Tal como no tempo colonial os filhos das elites não se misturam com os dos pobres. As escolas e os hospitais não são os mesmos. Aliás, os filhos dos feudocratas estudam nas melhores escolas do país ou no exterior.
 

A distribuição do rendimento nacional não é justa e equilibrada. Aliás, é um pequeno grupo e suas famílias que põem mão sem restrições na coisa pública. É injusto dizer-se que a guerra não é causadora da pobreza. Mas, seria cobardia calar as profundas assimetrias que colocam de um lado os milionários ligados ao poder político e do outro lado a grande maioria que nas mesmas circunstâncias continua abaixo da linha da pobreza. Porventura, alguém me pode dizer quais as raízes da riqueza dos nossos milionários?
 

Reféns à  dogmática do cristianismo colonial as nossas tradições e costumes continuam em último plano tal como no tempo do kaputo. Assim, são as nossas línguas. Em muitos casos as nossas tradições são meramente reduzidas, injustamente, a práticas feiticistas. O kangondo, o Lundongo, Katita, Isindika e outras danças foram enterradas. A gravata parece significar o civilizado. Os académicos caíram na supremacia do conhecimento reprodutivo. Servis à dogmática de racionalidade europeia mais não são senão instrumentos do lucro dos feudocratas. Por isso, infelizmente, quase ou nada publicam
 

Tal como no tempo colonial não são os pobres que enchem as cadeias? A justiça não anda a duas velocidades? Há independência dos tribunais, porventura? Aonde andam os corvos, coveiros, das liberdades e direitos fundamentais do homem?
 

A informação não se transformou em nevoeiro informacional como escreveu o meu professor da Universidade Aberta? Não está a informação ao serviço de quem governa com todos os fundamentos e manipulações para chamar a si a legitimidade?
 

Porventura, a imagem que a grande maioria tem é de um governo com elevado sentido pedagógico? Não é, acima de tudo, com arrogância, exibicionismo e força que a classe política dominante se apresenta a esse povo? Por que é que o povo está possuído de medo tal como no tempo colonial?
 

Aqueles que ajudam ou contribuem para a formação da consciência crítica do homem são tidos como inimigos ou frustrados.
 

Os cargos de chefia e direcção não estão, porventura, reservados aos professos da ideologia partidária dominante?
 

Embora, a Administração Pública não tenha cor a verdade é que o acesso aos serviços públicos é extremamente dificultada por uma gigantesca burocracia que marginaliza aqueles que não tiverem nome. Injustamente, o negro virou escravo do outro negro que é tratado com desdém e indiferença.
 

                                                                       “O Tempora! O Mores!”           Cícero
*Activista Cívico
Fonte: Club-k.net