Luanda -  Ao Caríssimo José Ribeiro, Director do Jornal de Angola, Tomo este espaço para traçar estas breves linhas para, antes de mais manifestar a minha solidariedade e espírito de coleguismo para si e a pléiade de profissionais que dia a dia labutam para trazer o nosso matutino às ruas. Quem sabe destas lides – eu certamente menos que a maioria da malta aí – sabe também que esta não é hoje, nunca foi antes uma tarefa fácil. Exige valentia, galhardia, sacrifício e sobretudo muito amor a esta profissão de jornalista que muitos já rotulam como a área parente pobre das ciências de comunicação: mais pobre certamente que as relações públicas, mais incompreendida e menos compensatória que a publicidade. Por isso, o meu reconhecimento sincero a todos os colegas – e não vou cometer o erro de esquecer os profissionais que não sendo exactamente ligados à área do jornalismo, como os paginadores, os técnicos de informática, os administrativos e outros, tão indispensáveis são para que toda a máquina funcione e “de manhã-manhãzinha” o Jornal esteja nas ruas de Luanda e voando para todo o País – o meu reconhecimento sincero, dizia, é sobretudo de um grande admirador vosso.

 

Fonte: Jornal de Angola

José Ribeiro não aceita reparos
e responde de forma mal criada

ImagePorém, em jeito de senão sem bela, caro Director, aproveito o ensejo de ir-me confessando gradualmente surpreendido – e não é exactamente uma agradável surpresa – com assumido pendor unilateralista das matérias por vós tratadas. Percebo isso, seja no volume das matérias ligadas ao partido maioritário, em relação aos da oposição, seja na relação entre as organizações da sociedade civil mais pró-governamental em relação à mais “independente” (as aspas são propositadas).

 


Ocorre-me então que esse fenómeno seja fruto de uma acentuada auto-censura de jornalistas que não queiram ser percebidos como simpatizantes com factos, eventos, instituições ou indivíduos “fora do sistema”, por um lado, ou então por aqueles outros, às vezes investidos de funções de direcção ou chefia que acham – e da sua sinceridade ninguém tem certamente sequer o direito de duvidar – que pelo facto de o vosso e nosso Jornal ser sustentado com fundos públicos, assim deve proceder. Ou ainda que dirigentes do Governo assim também pensem e exerçam o seu poder para vetar as informações ligadas à oposição ou a correntes divergentes das oficiais. Ou um bocado destas e doutras coisas semelhantes. Seja o que for que esteja por trás disso, representa uma mancha ao excelente trabalho que fazeis todos os dias e essa será talvez a maior razão que me leva a escrever-vos estas linhas.

 


Sei que o caro José Ribeiro, com a verticalidade e coerência que o caracteriza e com a experiência que tem demonstrado concordará comigo que exactamente pelo facto de o JA ser um órgão público deve fazer o seu melhor para levar a Informação a todos os cidadãos, incluindo aqueles que não votaram no partido actualmente no Governo. Porque apesar deste facto, eles também contribuem para o seu sucesso com os seus impostos e isso dá-lhes o direito de sentirem-se incluídos no processo de “gatekeeping”.

 


E parece-me que o argumento da falta de matérias noticiosas é constantemente desmentida pelos líderes da oposição e da chamada sociedade civil “independente”, pelo que talvez um esforço no alcance destas fontes redundasse na melhoria do vosso já excelente trabalho. A situação como está cria suspeições, vicia o jogo democrático porque dá a impressão de querer-se manipular a Informação – um sacrilégio em todas as escolas modernas de jornalismo, a não ser que justificadas pelo interesse público, o que nesse caso peca pelo inverso.

 


As recentes declarações do líder da UNITA, acrescidas às de outros líderes da oposição – as conferências de imprensa desse partido poderiam por exemplo ser melhor cobertas para que as suas mensagens fossem melhor percebidas – assim como as queixas de variados sectores da nossa sociedade, por recorrentes acabam por manchar o nosso jornalismo.

 

Com essa mania de sentir-me um apaixonado por essas coisas da comunicação social – curvo-me entretanto ao facto que em Angola como em África a idade e a experiência são um posto que todos devem respeitar, ao que no caso do caro Director junto uma consideração pessoal muito especial – tomo a iniciativa de escrever estas linhas com pedido de publicação, na esperança suscite uma reflexão já necessária sobre estas coisas. No caso do JA para um jornalismo não apenas de qualidade e referência técnica, mas também isento, plural e construído na ética que sustenta a beleza de fazer jornalismo. Apesar de tudo. Apesar de todos.

 

Termino expressando a minha esperança que não se melindrem comigo e publiquem estas linhas. Claro, como todos os motes para reflexão só valem por isso mesmo. Motes de reflexão e pouco mais...

 

* Celso Malavoloneke, Comunicólogo, Coordenador Adjunto da Licenciatura de Comunicação Social e Relações Internacionais da Universidade Privada de Angola – UPRA

 


José Ribeiro responde a Celso Malavoloneke

 

ImageA sua carta foi recebida no nosso correio electrónico com a classificação “indesejada”. Vá-se lá saber porquê, o sistema, neste caso o tecnológico, prega-nos também destas partidas. Recusamo-nos, no entanto, a ceder aos ditames da tecnologia e publicamos a carta que cordialmente nos escreveu, em tom muito diferente dos “mimos”, muitos dos quais injustos e até ofensivos, com que nos tem brindado no Semanário Angolense. A reflexão serena e madura é incompatível com o insulto.


No fundo o que está em causa na sua carta é saber se devemos dar crédito a mais uma posição manipuladora da UNITA contra o Jornal de Angola. Essa posição foi manifestada, uma vez mais, nos últimos dias. Se antes Samakuva se queixava do Jornal de Angola não cobrir as suas actividades, hoje exige do jornal uma “melhor cobertura” das suas conferências de imprensa. Muita coisa mudou em Angola e na imprensa angolana, a única que parece não mudar é a UNITA.


Como bem diz o senhor, o líder desse partido pretende manchar, sem qualquer legitimidade, o jornalismo feito pelo 0, que se tem vindo a afirmar, com muito esforço, como um jornalismo abrangente, responsável e influente. E isso não agrada à UNITA e aos políticos desonestos. Se os padrões de jornalismo do líder da UNITA são o “Terra Angolana” e a “Rádio Despertar”, estamos mesmo a ver para onde Isaías Samakuva gostaria de conduzir-nos.


Uma das práticas que norteiam o jornalismo feito pelo Jornal de Angola é a prática do exemplo e da ética. Gostaríamos de ver os profissionais de outras esferas, incluindo políticos e académicos, fazer o mesmo. O Estatuto Editorial do Jornal de Angola assenta em princípios e técnicas do bom jornalismo, universal, imparcial e objectivo que o senhor, como comunicólogo e coordenador da licenciatura de Comunicação Social da Universidade UPRA, deve conhecer muito bem.

 

Se procurasse investigar os factos que estão aí ao alcance de todos, melhor do que ninguém perceberia que os ataques que a UNITA faz ao Jornal de Angola nada têm a ver com a auto-censura dos jornalistas ou a má qualidade do jornalismo ou ainda o “gatekeeping”, mas com a tentativa de aproveitamento político de um partido que sempre teve da imprensa nacional e internacional uma noção “instrumentalista” e “lobbista”, o mesmo que gostaria de fazer com o Jornal de Angola. É disso apenas que se trata.


Somos suficientemente humildes para sermos os primeiros críticos do nosso trabalho. Temos procurado corrigir o que está mal e fazer o melhor que podemos, mas não aceitamos pressões políticas ilegítimas como as que a UNITA tem vindo a fazer sobre o Jornal de Angola.

 

Quanto à qualidade e referências técnicas a que se refere, deve saber, com certeza, que alguns dos 50 (cinquenta!) Licenciados que a UPRA acaba de “lançar no mercado” vieram ao Jornal de Angola oferecer a sua colaboração. Deve saber também que o Jornal de Angola teve de recorrer a um profissional de jornalismo de longa data, apenas para ensinar a esses jovens licenciados o que há de mais básico no jornalismo, tão fraca é a sua formação. É uma tarefa que nos dá muito prazer, formar licenciados que saem das Universidades, mas creia que ajudaria imenso à qualidade do Jornal se os licenciados nos chegassem melhor preparados. Como vê, o problema está, fundamentalmente, no “newsmaking”.

 

Finalmente, a ideia de que os órgãos do Estado devem fazer jornalismo equilibrado e os órgãos privados mau jornalismo é uma ideia perigosa. Não é segredo para ninguém que muitos órgãos privados também recebem fundos públicos. A UNITA, por exemplo, recebe fundos públicos e nem por isso se esforça por oferecer um serviço de qualidade. Antes pelo contrário.