Luanda - A história registou que os primeiros oficiais superiores das ex-FALA, incluindo o seu Alto-Comandante, o Dr. Savimbi, fizeram a sua formação militar na China, em 1965. Também registou que, no período da independência, vários jovens, entre soldados, cadetes e oficiais, saídos da tropa portuguesa, ingressaram nas fileiras das FALA. Nessa mesma fase, a Tanzânia ajudou a formar mais oficiais. Já no pós-independência, Marrocos treinou vários comandantes. Mas, a meu ver, a verdadeira Academia militar, que formou e ensinou aos guerrilheiros a lidar na prática com improvisos e a tomar decisões num contexto de alta pressão, ou a entender o dia-a-dia do soldado e a encarar de frente o inimigo, foi nas frente de combate. Afinal, os grandes combatentes são temperados no Campo de Batalha, somando vitórias e consentindo derrotas. Foi esta a impressão que tive depois de conversar demoradamente com um antigo combatente e veterano da pátria, o Coronel José Kungo. Após a conversa, recuei no tempo e surgiram na minha memória os nomes dos grandes Generais que, a dado período da Revolução, formavam o Pentágono das FALA: Chilingutila (Estado Maior General); Ben-Ben (Vice Estado Maior); Bock (Logística de Guerra - DGLOG); Nunda (Comissário Político Militar - COPOMI); Wambu (Serviços de Inteligência Militar - SIMI). Eles haviam-se doado de forma incondicional à causa e trabalhavam arduamente, independentemente dos riscos. Isso lhes valeu respeito, reconhecimento e admiração. Para muitos de nós, tornaram-se referências; inclusive, vários jovens sonhavam seguir os seus passos. Até houve quem adotasse como alcunha os seus nomes. Outros limitavam-se a imitar a forma de falar, de andar ou, nas farras, procuravam dar os toques de dança como eles. Não digo isso apenas por dizer. Nós somos testemunhas oculares, e posso afirmar, de boca cheia, que os guerrilheiros, quer os que actuavam no exterior do país, ou no interior, todos eles sob comando do seu Alto-Comandante, o Dr. Jonas Malheiro Savimbi, protagonizaram uma revolução ímpar em África. Na verdade, foi mesmo uma revolução, com os seus desafios...

Fonte: Club-k.net

No cômputo geral, os objetivos foram alcançados, apesar de que as Forças Armadas Populares de Libertação de Angola – FAPLA – não poupavam esforços no sentido de tomar de assalto a Jamba, Capital da resistência patriótica da UNITA. Diga-se a verdade, com o merecido respeito: os combatentes das FAPLA faziam das tripas, coração em busca dos seus objetivos. Havia vezes que ficavam sem abastecimento: passavam fome e sede. Que o digam aqueles que manobravam nas matas do Kapa-kapa, em direção a Mavinga. Isso mesmo nos foi contado pelos prisioneiros de guerra. Alguns deles jogaram futebol na equipa da Nova Aurora, do Brigadeiro Sabino Sandele.

Mas como a guerra já terminou, e os angolanos arrependeram-se de a ter feito, não faz nenhum sentido escamotear os factos nem adianta contar mentiras. Por isso é que fiquei triste, ofendido e desiludido ao ouvir da boca de um respeitado General dizer que os Generais das FALA eram marionetes dos Sul-africanos. Que disparate! Quem tem necessidade de diminuir o outro para se sentir forte - é fraco, fraquinho e desonesto. Quem foi General das frentes de combate, ou ainda, quem andou nas trincheiras com os soldados, não despreza nem tenta diminuir as capacidades dos seus oponentes - sejam eles das FALA ou das FAPLA. Um bom vencedor não desvaloriza os esforços dos adversários. E isto de esforços, entrega e sacrifícios - foram as grandes marcas dos guerrilheiros de Jonas Savimbi. Para tal, não faltam referências: lembro-me do General Regresso ( o meu primo Gerô) – na altura, Comandante das Transmissões – trabalhava até largas horas da noite e não tinha final de semana. Aliás, era assim com todo mundo, principalmente, os das TRMS e os das Comunicações do Alto-Comandante – DIVITAC, chefiadas pelo Brigadeiro Boza, e, mais tarde, pelo Brigadeiro Fuma. É importante salientar que nenhum desses comandantes recebia orientações dos racistas Sul-africanos. Pelo menos, nunca ouvimos um boato a sugerir tal situação humilhante.

Do mesmo modo, se alguém disser que os Generais Ndalu, João de Matos, Vietname, Zumbi, Higino Carneiro, entre outros, eram marionetes dos cubanos, estará simplesmente a mentir. Outrossim, não consigo imaginar que os das FALA pudessem ser manipulados pelos Sul-africanos. Dizer que os Generais Chendovava, Dembo, Chilingutila, Ben-Ben, Renato, Bock, Wiyo, Mbunji, Kanjundo, Numa ou qualquer outro militar, eram fantoches dos Sul-africanos, é pura mentira.

Gostando ou não, esta é a verdade e é o que a história registou. Isto é o nosso passado e é a nossa história. Garanto-vos que o que aqui escrevo é a verdade, apenas a verdade; não há nenhuma ficção. Quando conto que os guerrilheiros davam tudo para que as coisas corressem da melhor forma possível – apenas estou a falar o que nós vimos com os nossos próprios olhos! Quando digo que o segredo da guerrilha era a Disciplina e a Consciência Patriótica, e que todo sacrifício era pouco, quando o que estivesse em causa fosse a Pátria – não estou a mentir nem a enganar ninguém! Havia um comprometimento bastante forte com a causa. Todos tinham assimilado bem os fundamentos da luta. O espírito de solidariedade era valorizado e incentivado – principalmente, pelos Militares e Quadros Políticos. O egoísmo e o tribalismo eram combatidos severamente. Havia consciência de que a unidade fazia a força. E a força de cada um tornava a UNITA mais forte. Foi isso que vivemos na primeira pessoa; é tudo isso que nos animava e nos enchia de energia para que, quando chegasse a nossa vez, seguíssemos os exemplos de trabalho, dedicação e entrega dos grandes Generais e de todos outros guerrilheiros que se batiam por uma Angola que colocasse o angolano em primeiro lugar. Uma angola que aceitasse a convivência na diversidade de pensamento. Felizmente, em 1991, Angola deixou de ser um país de Partido único, e passou a ser um Estado Democrático de Direito, conforme reza a Constituição da República de Angola.

Infelizmente, vários filhos desta terra tombaram sem desfrutarem do sabor da Paz, e boa parte dos sobreviventes, aqueles que se sacrificaram na luta, não estão a colher os frutos da paz. Tudo porque o oportunismo selvagem colocou de parte os verdadeiros combatentes da liberdade - quer do lado das FAPLA, quer do das FALA.

O meu maior respeito aos heróis da pátria.

Voltarei...

Luanda, 3 de Agosto de 2023.
Gerson Prata