Luanda - O jornalista - ao contrário dos políticos que ficam mais presos no jogo de palavras para conquistar eleitores emocionados - trabalha com factos. São os factos que são analisados nessa minha observação e não discursos meramente populistas.
Fonte: A DENÚNCIA
Na qualidade de Jornalista e Director do Portal "A DENÚNCIA", tive a preocupação de ir à chamada "cerimónia de subscrição do processo de destituição do Presidente da República", uma iniciativa do grupo parlamentar da UNITA, realizada ontem, quarta, 16, no HCTA.
Fui para lá para ver se há novidades nos "factos" (acusações contra o PR).
O primeiro facto é que essa iniciativa não é do povo angolano, desmentindo aqui o presidente do GPU Liberty Chiyaka. Temos de ter um mínimo de bom senso. Na política, não pode valer tudo.
Para que esse acto fosse considerado "uma iniciativa do povo angolano", como considerou Liberty Chiyaka, a maior parte dos deputados (representantes do povo) tinha de subscrever tal lista, o que não aconteceu. Aliás, nem mesmo o grupo parlamentar da UNITA subscreveu na totalidade (90) essa iniciativa. Houve 86 assinaturas, embora tenha havido alegadas justificações para os quatro em falta.
Mesmo que tivessem as 90 assinaturas (dos eleitos pela lista da UNITA, que concorreram às eleições gerais de Agosto de 2022), não seria uma "iniciativa do povo angolano", porque o GPU não representa a maioria dos deputados. Logo, o argumento de Liberty Chiyaka, segundo o qual essa iniciativa representa uma "vontade do povo", cai por terra. Por outro lado, os outros deputados eleitos da oposição (FNLA, PRS e PHA) não compareceram ao acto (nem mesmo representantes da sociedade civil). Se tal acontecesse não daria, na mesma, uma "maioria dos deputados" para ser considerado "vontade do povo angolano". "Vontade do povo angolano" é "maioria dos deputados". Isso tem de estar claro.
A iniciativa é uma "vontade do grupo parlamentar da UNITA", ponto. Os factos provaram isso.
Em relação à iniciativa do GPU, eu acho ser um exercício normal num país Democrático e de Direito. O que não acho normal é ver o maior partido da oposição fazer claramente uma "diversão política", alimentando - gastando recursos financeiros para o efeito, quando não ajuda os pobres nem os mais necessitados, valores constantes no documento reitor da UNITA - um "nado-morto" (até podia tirar as aspas)!
Essa tentativa de destituição do PR João Lourenço é efectivamente um "nado-morto", por três razões:
1. Para que tal iniciativa fosse aprovada na Assembleia Nacional, 2/3 dos deputados tinham de a subscrever. Não havendo união na oposição e com o recente pronunciamento do presidente GPMPLA Virgílio de Fontes Pereira segundo o qual "não vai haver destituição e ponto", o que na prática significa que nenhum deputado do MPLA vai aderir à tal iniciativa de destituição do PR, fica claro, de forma antecipada, que isso não tem pernas para andar, ou seja, o assunto nem sequer vai ser alvo de discussão na própria Assembleia Nacional;
2. Supondo que por uma "estrelinha da sorte" - no caso de marimbondos do MPLA, alvos do combate à corrupção, uma iniciativa do PR João Lourenço no período 2017-2022, adiram, num possível "voto secreto", a essa iniciativa e o assunto seja aprovado para seguir trâmites judiciais, haveria outro entrave: as provas das acusações. Segundo o que pude ver no vídeo exibido ontem na cerimónia, sobre as "razões que concorrem para a destituição do Presidente da República João Lourenço", não acredito - e tive a oportunidade de dizer isso a alguns responsáveis da UNITA com quem conversei depois da cerimónia - que a UNITA tenha provas irrefutáveis contra o titular do Poder Executivo, na medida em que as acusações (mesmo que tenham alguma ligação com João Lourenço) são contra alegados actos protagonizados por auxiliares do TPE, na maior parte dos casos, e por juízes (que fazem parte de um outro poder). Tanto num caso quanto noutro, dificilmente se pode provar (para imputar culpas directas ao Presidente da República) que efectivamente houve um envolvimento directo da figura do PR.
Por exemplo: nada prova que alguém que seja morto numa manifestação tenha sido uma consequência de uma ordem directa do Comandante-em-Chefe João Lourenço. Um acto criminal protagonizado eventualmente por um agente da Polícia, no exercício das suas funções, por excesso de zelo e irresponsabilidade, não responsabiliza criminalmente o Presidente da República nem mesmo o Comandante-Geral da Polícia Nacional de Angola, porque o crime é intransmissível - salvo se houver provas irrefutáveis que mostrem que a execução criminal partiu directamente de uma ordem expressa do Presidente da República João Lourenço, o que eu não acredito, nem acho que a UNITA acredita na sua própria acusação, constituindo assim uma "diversão política".
Outrossim, acusar o Presidente da República João Lourenço de ser o juiz de todos os tribunais - "as sentenças e as decisões são encomendas de João Lourenço" - é outro assunto que não tem pernas para andar. Não acredito (nenhum cidadão minimamente lúcido acredita nisso) que a UNITA tenha provas irrefutáveis que mostrem que João Lourenço é que determina as sentenças e as decisões nos tribunais. Podíamos até dizer que achamos que tem havido alguma interferência política no Poder Judicial mas "achar" não é "certeza" para acusar directamente o PR como sendo "o decisor" do Poder Judicial. Isso é ser exageradamente extremista e irresponsável. Fica claro que a UNITA, caso o assunto seja aprovado na Assembleia Nacional, não vai conseguir provar essa acusação ao Tribunal Constitucional (quando se referir a violações de natureza constitucional) nem ao Tribunal Supremo (quando imputar crimes ao Presidente da República, se tal acontecer). E o mais caricato é que os responsáveis do Tribunal Constitucional e do Tribunal Supremo são juízes que a própria UNITA alega terem protecção do Presidente da República João Lourenço. Ou seja: não vai apresentar provas irrefutáveis contra o PR João Lourenço ao TC nem ao TS e espera uma decisão contra João Lourenço, quando os responsáveis desses dois tribunais são "protegidos de João Lourenço"?Então, qual o efeito prático desse impeachment? Se não é uma "diversão política" ou um "show off" da UNITA é o quê? Qual o efeito prático dessa iniciativa de destituição do PR, se os tribunais não são independentes, tal como a UNITA afirma?
O único possível facto que vi nas "razões de destituição do PR" é o ajuste directo que o PR tem feito nas contratações públicas. Neste aspecto, é mais fácil provar a sua culpa, caso seja mesmo uma violação grave à Constituição para dar direito à sua destituição (o que também tenho dúvidas);
3. Ainda supondo que o assunto tenha passado pela Assembleia Nacional (com aprovação de 2/3 dos deputados) para os tribunais, o Tribunal Constitucional e o Tribunal Supremo - mesmo sem provas irrefutáveis contra João Lourenço, mas admitindo aqui a "teoria do absurdo" que pode existir em política, onde a lógica deixa de ter lógica! - decidam considerar o Presidente da República João Lourenço "culpado" dos crimes e das violações à Constituição e se efectivasse a destituição do PR, teríamos a Vice-Presidente da República Esperança da Costa (do MPLA) a dirigir o país até 2027. É o que diz a Constituição. No caso de a Vice-Presidente se sentir impedida (por solidariedade ao presidente destituído), teríamos a Presidente da Assembleia Nacional Carolina Cerqueira (do MPLA) a assumir os destinos do país até 2027 - na prática a cumprir, na mesma, o mandato do MPLA, uma vez que o presidente do MPLA continuaria a ser João Lourenço, a mandar em Esperança da Costa ou em Carolina Cerqueira, e se calhar até a tomar um vinho numa ilha desértica qualquer! Volto à minha pergunta - mesmo admitindo hipóteses absurdas - qual o efeito prático dessa destituição, se o MPLA (João Lourenço) continuaria na mesma no poder até 2027, a julgar que o sistema angolano não prevê eleições antecipadas nos casos de destituição do PR? O que a UNITA ganha com esse exercício? Qual o efeito prático disso? O que muda na vida dos angolanos?
Qualquer cidadão de bom senso - que sabe somar 1+1, porque nem todos sabem! - sem precisar estudar Direito percebe que essa tentativa de destituição do Presidente da República João Lourenço, por parte do grupo parlamentar da UNITA, é apenas para "fazer uma história ruidosa" em Angola. Fazer história é com factos. Não é com populismo. Não há nenhuma dúvida de que estamos perante uma autêntica "diversão política", sem pernas para andar. É um claro "nado-morto".
A UNITA de Adalberto Costa Junior está mais uma vez a provar ao país que é uma organização que faz política populista e irresponsável (para enganar angolanos emocionados que pensam pouco) sem se preocupar com questões estruturantes do país. Numa altura em que as populações angolanas esperam uma oposição séria para apontar caminhos alternativos para se mudar o quadro da fome, da pobreza, das desigualdades sociais, da desvalorização do kwanza, dos baixos salários, da falta de emprego, etc., vem o maior partido da oposição promover uma "diversão política" sem nenhum efeito prático? Gastar dinheiro e energias para não alterar nada na prática? Que partido sério faz isso?
Repito o que tenho dito: Angola é azarada até na oposição. O angolano tem dedo podre a escolher políticos!