Luanda - Durante o meu tempo como estudante de Economia em Londres, um dos meus professores sempre enfatizou a importância de uma mudança de paradigma na sociedade na vida pessoal na forma de fazer as coisas. Ele sempre citou o famoso livro do escritor Kuhn que define a mudança como “uma mudança importante que acontece quando a maneira usual de pensar ou fazer algo é substituída por uma maneira nova e diferente”. Hoje, mais de 50 anos depois do livro de Kuhn, estas definições podem parecer mais intuitivas do que técnicas.

Fonte: Club-k.net

Numa linguagem simples, uma mudança de paradigma acontece na forma como as pessoas pensam e fazem as coisas, e que altera e substitui um paradigma anterior. Uma mudança de paradigma pode resultar da acumulação de anomalias ou de provas que desafiem o status quo, ou devido a alguma inovação ou descoberta revolucionária.


Essas descobertas devem basear-se num propósito claro, que seria a produção de bens e serviços impulsionada pelo objetivo de criar uma sociedade que seja económica, social e ambientalmente sustentável e restauradora. O problema das gerações de hoje, seja em Angola ou na aldeia global, é que medimos o sucesso em termos de crescimento financeiro, casas grandes, carros luxuosos, empregos de prestígio, reputações invejáveis ​​e consumo conspícuo. Dessa forma, Angola poderá ser condenada ao fracasso. No entanto, este ainda é o paradigma que orienta as nossas escolhas hoje.


A ficção do capitalismo, de que a busca desenfreada dos interesses individuais, resulta no bem maior para todos, está agora a destruir a capacidade do planeta de continuar a sustentar a vida. A catástrofe climática que estamos a criar, resultará na extinção da raça humana (você e eu), ou no fim da nossa civilização global. Se bem que isso, é algo discutível, porque o que distingue a humanidade de outras formas de vida é a nossa civilização global. Quando isso termina, a singularidade do ser humano diminui enormemente.


Em Angola, o mais sensato deveria ser concentrarmo-nos na manutenção da nossa cultura e civilização, o que requererá que as atuais exigências energéticas da nossa civilização sejam drasticamente reduzidas. Isso exigirá interromper nosso uso descuidado de energia e praticamente eliminar a combustão para produzir essa energia. Contudo, com uma população global de mais de oito mil milhões de pessoas, a abstenção e a utilização inventiva de tecnologias de energia limpa não serão suficientes. Isso inevitavelmente exigirá uma redução substancial da população humana. Sob o paradigma atual, isto não acontecerá voluntariamente, mas infelizmente a Mãe Natureza irá insistir neste ponto.


Ao azar nosso, junte-se o fim do clima relativamente benigno que se viveu no seculo passado. Pelo andar das coisas o atual clima, produzirá adversidades que reduzirão rápida e dramaticamente a população humana, e não sem muito sofrimento. Vivo em Flórida já a 8 anos que aqui tenho visto a dor e a destruição que os furacões e chuvas torrenciais que se embatem a esta península trazem aos habitantes. Isso já está a acontecer, mas não de uma forma que tenha conseguido separar a maioria de nós do mundo fictício que criamos, o de querer sempre mais e melhor. Isso certamente acontecerá nos próximos dez a vinte anos, talvez.


Será que precisamos mesmo de um novo paradigma? O que é necessário, na minha opinião, é um novo paradigma que celebre o papel dinâmico e positivo que todos os angolanos podem abraçar em formas democráticas de gestão e assumamos o compromisso de acabar com a pobreza e a discriminação em Angola.


E quanto ao progresso e ao desenvolvimento de que Angola tanto almeja? Ao mesmo tempo, esse desenvolvimento deve ser sustentável, devemos utilizar as novas tecnologias de forma inovadora e investir nas nossas infraestruturas educativas e de desenvolvimento da força de trabalho e na juventude sem reservas. Este novo paradigma que aqui advogamos, deve abranger uma visão ampla de criação de oportunidades que conectem muitas peças diferentes existentes no tecido socio económico desta geração. Ao mesmo tempo, essa mudança deve fazer sentido, porque tem de se basear na compreensão de onde estivemos – e para onde nós (os angolanos e o mundo) precisamos de ir.


A narrativa de que, meio seculo de independência se fez mais do que o colono em cinco seculos, pode até ser visto como um insulto a nossa inteligência coletiva. Meu professor de ensino primário o amado Professor Mario José (em memoria) ostentava um pendor e presença invejáveis, naquele tempo do colono. que hoje nem um professor universitário em Angola consegue viver. Essa profissão já foi respeitada e tinha benefícios. E hoje, o que se vê na vida de um professor de ensino de base? Só neste paradigma, vemos que estamos na lama a meio século, isso sim. O paradigma pretendido aqui, deve ser baseado em práticas que funcionam e com protótipos que podem ser replicados e impactar vidas em maior escala.


Angola hoje, que saiba, está cheia de pessoas bem formadas, dentro e fora do Pais e que poderiam tornar essa mudança possível. Isto se houvesse uma política meritocrática, ou seja, colocar as pessoas certas nos lugares certos. Isto em Angola não aconteceu, porque nas últimas quatro décadas de independência, tudo tem sido feito sem bases próprias. Porquê? Porque em Angola para você exibir a sua tecnocracia, isso dependerá maioritariamente de quem você conhece ou da sua filiação partidária para que você possa contribuir a nível macro para o bem-estar da nação. Às vezes parece que alguns dos melhores filhos de Angola, não são necessários para as tarefas gigantescas que o nosso país enfrenta. Até que este paradigma seja revertido, muitos de nós seremos apenas números. Sim, apenas números.


Basta olhar para o despedimento de quase 70% dos angolanos recrutados pelas grandes petrolíferas que operam em Angola em 2002. Eles foram enviados para Londres, Houston, Cairo, etc., para serem adequadamente treinados para serem os líderes do setor amanhã. Mas o que se viu, foi que sob o olhar mafioso da Sonangol, no início de 2012, para muitos desses quadros significou que o amanhã e esse sonho nunca seriam possível, porque foram injustamente mandados para casa, para que os expatriados ( os filhos da casa) continuassem a manter seus empregos em Angola ganhando 5 vezes mais que os quadros angolanos. Isso ninguém me contou, vivi isso na ex. BP Angola.


Imaginemos que a maioria desses angolanos como eu, Kumba de Almeida. Samuel Chivukuvuku, Anderson Kamukotele (em Memoria), para citar os poucos, custou a petrolífera BP perto de Usd $3 Milhões de dólares americanos para cada um durante a formação destes no Reino Unido durante 3 a 4 anos. Esses custos foram todos já recuperados com juros pela BP e outras petrolíferas estrangeiras da Sonangol dentro dos parâmetros do Contrato de Partilha ( PSA) em vigor no sector.


Tecnicamente analisado, como alguns deles foram sumariamente despedidos, e nunca foram devolvidos de volta ao sector petrolífero ate hoje, estes investimentos feitos depois de 2002, com o advento da paz, na maioria dos casos, foram em vão. Na minha opinião, a Sonangol se fosse uma organização séria, com bolas do tamanho da torre de Eiffel, deveria criar oportunidades para estes quadros ou cobrar das companhias petrolíferas, que abusaram do sistema desta prática de formar e depois despedir sem justa causa.


Mas sabemos que isso nunca acontecerá - tanto se falou em angolanização – tivemos vários Ministros dos Petroleos e Secretários de estado, e ate hoje nenhum dele pode dizer que implementou as politicas da angolanização a 100%. A mudança de paradigma no sector petrolífero ainda é hoje como se fosse um tabu. Os jovens que ingressam neste importante sector, formandos no país ou fora, são tratados como se fossem de uma classe inferior aos expatriados que por cá passam e choram quando o tempo deles se esgota. A quem mesmo diga, que o tratamento dos quadros angolanos nas petrolíferas em Angola, não difere daquele que as empresas chinesas oferecem aos angolanos.


Onde esta a mudança de paradigma desse meio século se mesmo em Luanda por exemplo, nota-se que a Avenida Fidel de Castro exibe imagens de uma colónia chinesa com todo comercio dominado por eles. Até conseguem visto de trabalho para virem aqui em Angola só para reparar e lavar viaturas. O meu MPLA devia ter vergonha desta mancha. Assim, uma mudança de paradigma é imperativa e isso não tem nada a ver com a cor da camisola partidária.


Finalmente, para dizer as elites que inundam a administração do Presidente João Lourenço, que muito esta por se fazer. Para que haja mudança de paradigma em Angola, a sua equipa de apoio, deve com zelo, dedicação e com muito esforço inspirador, abraçar essa mudança, para ajudar a moldar o nosso futuro industrial – desde coligações trabalhistas de base ampla, oportunidades para a juventude, (com o apoio dos governos locais) e com mais estratégias amigas do ambiente. Só então a verdadeira mudança de paradigma se traduzirá em ganhos para o país. Para essa tarefa, contem com muitos de nós.


 Consultor Económico