Luanda - Para fazer o enquadramento da recente decisão que consta do acórdão n.° 114/24-G, do Tribunal da Relação de Luanda, em reflexão, recordo que no ordenamento jurídico angolano todos os cidadãos, após conclusão das suas licenciaturas em Direito, têm a liberdade de escolher, entre outras, uma das seguintes opções profissionais, designadamente, notário, conservador, advogado ou magistrado.

Fonte: Club-k.net

Acórdão n.° 114/24-G do Tribunal da Relação de Luanda

Convém também recordar que para fazer o ingresso nestas profissões, os candidatos são submetidos a um EXAME DE AFERIÇÃO DE CONHECIMENTOS.


Os candidatos APROVADOS NO EXAME ingressam no estágio, enquanto os que não são admitidos devem esperar pelo ano seguinte, a fim de concorrerem novamente.


Haverá Limitação AO DIREITO DE ACESSO AO EMPREGO consagrado na Constituição nos exemplos acima? A resposta é óbvia: Não.

O actual arquétipo jurídico-constitucional angolano atribui à OAA a competência para auto-regular o acesso à advocacia. A OAA é, como se sabe, uma instituição independente dos órgãos do Estado.


O art.° 193.°, n.° 3 da C.R.A atribui competência à OAA de providenciar a "regulação do acesso à advocacia”, a disciplina do seu exercício e do patrocínio forense, nos termos da Lei e do seu estatuto.

A OAA entendeu no âmbito do seu poder de auto- regulação que o acesso à advocacia deve partir de um Exame para aferir as competências científicas dos candidatos, diga-se de passagem, à semelhança dos exames públicos.

Tendo como base os seus Estatutos ( al. c) do art. 33.°), o seu CN tem competência para deliberar sobre todos os assuntos que dizem respeito ao exercício da profissão, aos interesses dos advogados e a gestão da Ordem dos Advogados que não estejam especialmente cometidos a outros órgãos da Ordem, sem prejuízo do disposto no artigo 24º, nº 2.

O CNOAA tem também competência de fazer à inscrição dos advogados e advogados estagiários e manter actualizados os respectivos quadros gerais (al. d) do 33.° do EOAA).

Posto isto, pensamos não existirem dúvidas sobre se o acesso à advocacia é matéria doutros pelouros que não o CNOAA.


A inscrição na OAA como advogado ou advogado estagiário é matéria do pelouro do CNOAA.

A função de proceder à inscrição, permitir a frequência ao estágio, emissão da cédula de estagiário, e, após a frequência e a avaliação favorável, a emissão da licença como advogado são matérias do pelouro do CNOAA.

Por conseguinte, os regulamentos n.° 1/19, de 7 de Março e 2/22 de 15 de Março, ambos do CNOAA não padecem de nenhum vício de ilegalidade material, ou seja, não são matéria da alçada do poder legislativo (art. 164.°, al. c) da C.R.A).

Os regulamentos n.° 1/19, de 7 de Março e 2/22 de 15 de Março, não excedem nenhuma das citadas normas habilitantes nem padecem de nenhum vício contra o Estatuto. As suas normas estão em perfeita sintonia com os Estatutos.

A OAA tem competência regulamentar quanto ao exercício da advocacia, nos termos da al. b) do art. 3.° do E.O.A.A, de atribuir o título profissional de advogado e de advogado estagiário e regulamentar o exercício da respectiva profissão.

Assim, a decisão de reformar o modo de acesso ao estágio introduzindo o Exame Nacional de Acesso à advocacia com o fito de aferir a preparação científica e os conhecimentos jurídicos dos candidatos à advocacia é sem sombra de dúvidas uma atribuição da OAA.

A aprovação de um regime único de acesso, sistematizado em quatro pilares: exame de acesso, inscrição dos advogados estagiários, estágio de advocacia e inscrição de advogado é matéria de auto- regulação.

O art. 1°. do Regulamento n.° 1/19 determina a realização de um Exame Nacional de Acesso à Advocacia, seguindo-se a inscrição como advogados estagiários, estágio e formação inicial obrigatória para advogados.

O art. 5°. estabelece, por sua vez, que a inscrição como advogado estagiário depende da classificação positiva no Exame Nacional de acesso e a partir do art.°7.° se elenca as normas relativas aos citados exames.

O regulamento n . ° 2 /2 2 , de 15 de Fevereiro, vem decalcar o citado regime.

Feita uma comparação entre os requisitos previstos nos EOAA e os regulamentos citados consideramos que os regulamentos estão em conformidade com as normas Estatutárias, pois estas não proíbem a OAA de submeter os licenciados em Direito, que pretendam enveredar pela advocacia a um EXAME com vista a se apurar os mais dotados de conhecimentos jurídicos científicos.

Concluindo: Trata- se de matéria que é da competência do CNOAA;

Os Regulamentos têm como suporte os E.O.A.A e a C.R.A.

Cabe ao CNOAA regular o acesso à profissão de advogado, incluindo os estagiários, matéria que está prevista no art.° 3 do EOAA.


Este poder de regular o acesso à advocacia pela OAA é o garante da independência e de profissionais competentes na defesa dos direitos interesses e garantias fundamentais dos cidadãos.

O Exame Nacional de Acesso à Advocacia não limita (coarcta) o direito fundamental de acesso à profissão de advogado aos candidatos, ficando estes inibidos de frequentar o estágio, pois os candidatos sempre poderão ter acesso à inscrição como advogados estagiários na OAA desde que demonstrem que reúnem os requisitos de inscrição, isto é, formalmente os documentos (certificado de Licenciatura, cópia do B.I. Fotografias, etc) e cientificamente os conhecimentos de Direito exigidos pela Ordem (auto-regulação).

Os licenciados devem reunir um conjunto de virtudes morais, não constarem informações criminais nos seus cadastros, estarem em pleno gozo de direitos civis e políticos, serem capazes de administrar as suas pessoas e bens e não estarem em situações de incompatibilidade com o exercício da advocacia (art. 98.°, n.° 1 e 2, e art.°41.° e 99.° do E.O.A.A).

A decisão em análise é o terceiro atentado contra à advocacia em Angola.

O primeiro atentado ocorreu com o acórdão n.° 700/21 do Tribunal Constitucional, que decidiu, contra o entendimento legal do artigo 2.° da Lei do Processo Constitucional onde se estabelece que, “aos processos de natureza jurídico-constitucional, em tudo quanto não esteja expressamente previsto na legislação reguladora do Tribunal Constitucional, aplicam-se com as necessárias adaptações, as normas do Código de Processo Civil”.

Na sua apreciação, o TC considera que nas acções judiciais que envolvam partidos políticos e coligações de partidos políticos, dispensa-se a constituição obrigatória de advogado.

Este argumento do TC contende com a alínea c) do n.°2 do art. 32.° do CPC, que impõe a constituição de advogados nas acções judiciais que corram trâmites nos tribunais superiores. O TC é um tribunal superior.

O segundo atentado ocorreu com a decisão que consta do acórdão n.° 814/23 de 10 de Abril do tribunal Constitucional que contraria expressamente o art. 20°, n.° 1, al. a) da Lei da advocacia - 8 /17, de 23 de Maio que estabelece claramente: “ São actos próprios dos advogados o exercício do mandato forense em qualquer tribunal INCLUINDO OS TRIBUNAIS ARBITRAIS.

Na sua apreciação, o TC considera que nos processos arbitrais podem ser mandatários das partes quem não esteja inscrito na OAA.

Noutra reflexão (texto) que publicarei oportunamente, apresentarei a legislação que dispensa a inscrição na OAA de licenciados em Direito afectos a certa instituição pública quando se trate de representação em processos judicias .

Diante destes factos, que visam esvaziar o poder de auto-regulação da OAA, fica o apelo aos advogados e advogados estagiários para que actuem numa só voz, sob liderança do bastonário da OAA, Dr. José Luís Domingos.