Luanda - É verdade que a Assembleia Nacional não foi autora do acto de designação do Presidente da Comissão Nacional Eleitoral (CNE), atribuição que pertence ao Conselho Superior da Magistratura Judicial (CSMJ). Todavia, é de lei que à Assembleia Nacional compete conferir posse ao designado, o que, por si só, configura um acto jurídico relevante, de natureza instrumental, sim, mas essencial para a produção plena dos efeitos jurídicos do acto do CSMJ.

Fonte: Club-k.net

Ora, se a Assembleia Nacional participa do processo, ainda que de forma “derivada”, deve-se reconhecer que ela possui legitimidade passiva processual, na medida em que actua como agente coadjuvante na eficácia do acto impugnado, não se trata de uma questão meramente formal, mas sim de uma ligação material e funcional ao objecto do litígio constitucional.

No plano do direito processual constitucional, sobretudo quando está em causa uma providência cautelar de natureza urgente, deveria prevalecer o princípio da efectividade e da prevenção de danos constitucionais irreparáveis, o Tribunal tem o dever de garantir o respeito pela Constituição de forma célere e eficaz, assim, permitir-se-ia a apreciação, ainda que em caráter sumário, do mérito da pretensão cautelar, em nome da salvaguarda do interesse público e da integridade dos princípios constitucionais.

Ao optar pelo indeferimento liminar com fundamento na ilegitimidade passiva da Assembleia Nacional, o Tribunal Constitucional deixou de cumprir, com a devida profundidade, o seu papel de garante último da Constituição, demonstrou um comportamento que, sob o ponto de vista da imparcialidade judicial, suscita sérias reservas, o que se esperava não era uma fuga técnica à apreciação do mérito, mas uma actuação proactiva e corajosa, que colocasse os princípios constitucionais acima de qualquer interesse.

Ao não enfrentar o cerne da controvérsia, a alegada inconstitucionalidade do regulamento do concurso que culminou na designação do Presidente da CNE, o Tribunal deu um sinal político perigoso: o de que as questões de elevada sensibilidade institucional podem ser afastadas por meras questões formais, mesmo quando está em causa a integridade de órgãos eleitorais, Como bem advertiu J.J. Gomes Canotilho, “o formalismo jurídico, quando desprovido de sensibilidade constitucional, transforma o Direito num ritual vazio, distante da justiça.”

Mais ainda, ao recusar-se a analisar uma providência cautelar que visava apenas suspender os efeitos de um acto até que se julgue a sua constitucionalidade, o Tribunal actuou como se não estivesse comprometido com a defesa preventiva da legalidade constitucional, uma função que lhe é imposta pela CRA e pela própria Lei do Processo Constitucional.

Não se pode ignorar que há um interesse público directo e relevante em assegurar que os processos de designação dos membros da CNE, especialmente o seu Presidente, sejam totalmente transparentes e conformes aos ditames constitucionais, sob pena de se comprometer a confiança dos cidadãos nas instituições democráticas, ao fazer uma “fuga técnica”, o Tribunal não apenas falha na missão de proteger a Constituição, mas reforça a percepção pública de que há selectividade nas suas decisões, dependendo da sensibilidade política dos envolvidos.

Portanto, longe de garantir a justiça constitucional, esta decisão representa um retrocesso institucional e confirma a necessidade urgente de repensar o modelo de composição, funcionamento e indicação dos Juízes do Tribunal Constitucional, para que este atue verdadeiramente como guardião imparcial e independente da Constituição, e não como árbitro condicionado por conveniências do momento.

Por:Nadilson Paim-Jurista.