Lisboa  - Carlos Gomes Júnior, primeiro-ministro e candidato às eleições presidenciais da Guiné-Bissau, está vivo. Segundo o que A BOLA apurou, Carlos Gomes Júnior encontra-se em lugar seguro e protegido pela Missang, Missão Angolana de Apoio à Reforma do Setor Militar da Guiné-Bissau.


Fonte: Club-k.net


Carlos Gomes Júnior (foto ASF)Manobras de golpe militar em marcha na Guiné-Bissau


 capital da Guiné-Bissau é uma cidade dominada por forças militares desde a noite de quinta-feira, quando uma sucessão de tiroteios e ocupações de pontos estratégicos principiou mais uma tentativa de golpe de Estado naquele país africano. Chegaram a circular rumores de que o primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior, candidato à Presidência, teria morrido depois de a sua residência ter sido atacada à granada. Uma informação entretanto contrariada pelo PAIGC. De Lisboa saiu um “veemente apelo” do Governo português “à cessação de todos os atos de violência”.

 

As movimentações dos militares guineenses em Bissau começaram ao cair da noite, na véspera do início da campanha para a segunda volta das eleições presidenciais, que deveria ter lugar a 29 de abril. Disparos de armamento pesado antecederam a ocupação das principais artérias da cidade e de edifícios estratégicos. As manobras incidiram sobre a Presidência da República e a residência do primeiro-ministro, que terá sido visada com granadas e posteriormente incendiada.

 

Sob custódia dos militares estarão agora o Presidente interino, Raimundo Pereira, e um número indeterminado de membros do Governo. O primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior, que foi o candidato mais votado na primeira volta das presidenciais, com 49 por cento dos votos, chegou a ser dado como morto. Mas uma fonte da sua formação política, o Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), disse entretanto à Antena 1 que o governante se encontra em local seguro.


As tropas ocuparam os edifícios da rádio e da televisão públicas do país e cortaram as emissões. No Hospital Simão Mendes, a única unidade do género na cidade, não há energia elétrica. Por ora, não há também notícia de mortos ou feridos. Os militares assumiram ainda posições junto à Embaixada de Portugal, uma situação já confirmada pelo embaixador António Ricoca Freire, e diante da delegação da RTP em Bissau. Os primeiros instantes do golpe foram testemunhados pelo correspondente da estação pública portuguesa, cuja equipa de reportagem foi impedida de recolher imagens. “Pode-se dizer que a RTP também está tomada. Não entraram, mas não permitem nem a entrada nem a saída de pessoas da delegação da RTP. Há muitos militares na rua que estão a controlar praticamente tudo e todos”, indicou durante a noite o correspondente da RTP em Bissau, Fernando Teixeira Gomes.


CASA CADOGO 1“O que posso confirmar é que houve disparos – e disparos muito violentos – junto à casa de Carlos Gomes Júnior. Se Carlos Gomes Júnior estava lá dentro ou não, não posso confirmar. Entretanto começaram a correr boatos de que ele estaria morto, mas eu não posso confirmar”, relatava ontem à noite Fernando Teixeira Gomes, ao telefone para o Hoje, na RTP2, a partir de Bissau.


“Houve um graduado que nos retirou a câmara. Portanto, ficámos sem a câmara. Abriu brutalmente a porta da viatura e tirou-nos a câmara. De imediato apontou-nos a arma, para sairmos dali, que não tínhamos nada ali a fazer. Fomos para junto da delegação da RTP, para recolher outra câmara, e nessa altura, quando estava lá dentro o cameraman, chegou uma carrinha de caixa aberta com militares, que cercaram a delegação, e como eu estava cá fora na viatura da RTP também me apontaram a arma e disseram para eu sair dali”, relatou o jornalista.


“Não haverá campanha para ninguém”

Os disparos deixaram de ser ouvidos depois das 21h00 (22h00 em Lisboa) e a situação parece ter acalmado. Várias ruas permanecem, todavia, encerradas e o medo estará a alastrar entre a população, uma atmosfera resumida à Antena 1 por um recepcionista de um hotel de Bissau: “A situação neste momento está calma, porque não se ouve troca de tiros. Aqui no hotel já temos luz pública, mas há outras partes que não têm luz. No hospital nacional não há luz. Há pânico. Há nervosismo da população”.

 

Pouco antes das movimentações de tropas o antigo Presidente guineense Kumba Ialá, segundo candidato mais votado na primeira volta das eleições, com 23 por cento dos votos, montara uma conferência de imprensa para tornar a exigir a anulação do escrutínio, alegando fraudes. Horas antes, o PAIGC havia difundido um comunicado de teor crítico para com os militares.


Sem querer acatar o acórdão do Supremo Tribunal que indeferiu um recurso interposto por meia dezena de candidatos presidenciais, Kumba Ialá instou a Comissão Nacional de Eleições a remover a sua fotografia dos boletins de voto da segunda volta e afirmou mesmo que não haveria “campanha para ninguém”, prometendo “formar e reforçar” as estruturas da sua força política. O PRS, garantia o antigo Chefe de Estado, estaria “no terreno para ver quem avança para a campanha”.

 

CASA CADOGO 2“Nós já dissemos que não haverá campanha para ninguém. Já afirmámos e repetimos várias vezes que não haverá campanha a nível nacional. Caso vier alguém a fazer campanha, a responsabilidade será desse alguém e as consequências serão dessa pessoa, porque eles sabem que não há condições para que ninguém faça campanha”, vincaria ainda Kumba Ialá, para garantir que o PRS se mantinha vinculado a uma “via ordeira e pacífica”.
“Grande preocupação” em Lisboa

 

Num comunicado com a chancela do Ministério dos Negócios Estrangeiros, o Governo português fez “um veemente apelo à cessão de todos os atos de violência e ao respeito pela legalidade” na Guiné-Bissau” e afirmou estar a acompanhar “com grande preocupação os acontecimentos” que se estão a desenrolar naquele país.

 

“A Embaixada de Portugal em Bissau seguiu e desenvolve os procedimentos de prevenção adequados, tendo aconselhado os cidadãos portugueses a permanecer em casa”, lê-se no documento do gabinete de Paulo Portas, que sublinha ainda que “Portugal mantém estreita articulação com os seus parceiros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, nomeadamente com a Presidência angolana, bem como com a União Europeia e as Nações Unidas”.


O Brasil já solicitou, de resto, uma reunião de emergência do Conselho de Segurança das Nações Unidas dedicada aos acontecimentos na Guiné-Bissau, segundo uma fonte diplomática citada pela agência Lusa. Brasília tem a seu cargo a presidência da Comissão para a Consolidação da Paz na Guiné-Bissau junto da ONU.


Em representação da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), o ministro dos Negócios Estrangeiros da Costa do Marfim condenou “formalmente e rigorosamente a tentativa de golpe de Estado” em Bissau. Daniel Kablan Duncan, que falava aos jornalistas na sequência de uma reunião ministerial da organização sobre as situações do Mali e da Guiné-Bissau, em Abidjan, assinalou que a CEDEAO “tem capacidade suficiente para intervir”.