Luanda -  DECLARAÇÃO POLITICA DA UNITA, POR OCASIÃO DO DEBATE E VOTAÇÃO, NA GENERALIDADE, DO OGE 2015

Excelência Senhor Presidente da Assembleia Nacional; Ilustres Auxiliares do Titular do Poder Executivo;

Mui caros Deputados;

Minhas Senhoras e meus Senhores:

Da “Reserva Financeira Estratégica Petrolífera”

Os deputados são chamados, hoje e esta manhã, a pronunciarem-se sobre a proposta de Orçamento Geral do Estado para o exercício económico 2015. E a primeira constatação que se faz é que, no próximo ano, o Estado vai gastar mais 1 bilião Kz do que vai arrecadar, no que será o maior défice orçamental desde 2002.

A proposta de Orçamento Geral do Estado para 2015 prevê receitas correntes de 4,2 biliões Kz (uma quebra de 4,9% face à previsão de execução de 2014), e despesas de 5,2 biliões Kz, (um salto de 19,1%). O maior défice orçamental no período pós Paz aconteceu em 2009, ano em que as despesas excederam as receitas em 293,7 mil milhões Kz.

Considerando o saldo orçamental em percentagem do Produto Interno Bruto o “record” dos défices foi batido em 2003, ano em que o buraco orçamental foi o equivalente a 13,7% dos bens e serviços produzidos em Angola.

Em 2015, o défice público em percentagem do PIB vai fixar-se em 7,6%; um buraco orçamental que vai obrigar o Estado a endividar-se. A dívida pública angolana vai aumentar “cerca de 6,3 pontos percentuais do PIB”. Ou seja, o próximo ano deverá encerrar com o nível de endividamento público nos 35,5% do PIB, contra os 29,2% previstos para 2014. O Governo não adianta valores em Kz, mas considerando as suas projecções para o PIB, o stock da dívida pública deverá ascender a cerca de 3,7 biliões Kz no final deste ano, aumentando para perto de 4,8 biliões Kz em 2015. O país precisa de se endividar tanto?

E o aumento do endividamento ainda pode ser maior caso a queda do preço do petróleo nos mercados internacionais se acentue.

Senhores deputados,

Neste Orçamento, o défice público aumenta 40 vezes, para cerca de 1 bilião Kz, o maior saldo negativo desde o fim da guerra, num momento marcado por forte incerteza devido à queda do petróleo;

Pela primeira vez desde o fim da guerra, o OGE prevê mais verbas para a educação e saúde – com 1.063 mil milhões Kz no conjunto, equivalentes a 14,7% da despesa total – do que para a defesa, segurança e ordem pública – fixadas em 1.023 mil milhões Kz, ou seja 14,1%. Mas isso chega? Claro que não.

O envelope financeiro do ensino superior (com 95,2 mil milhões Kz) continua a ser superior ao do ensino secundário (com 83,8 mil milhões Kz). E o facto de este último grau de ensino ter mais escolas e alunos sugere que algo pode estar mal em termos de prioridades. Continuamos a ter, no país, mais vontade de fazer escolas do que ter um ensino de qualidade. E é disso que Angola precisa se quiser colocar a nossa juventude, de forma sólida e eficaz, na rota da concorrência.

A UNITA já vai com a voz rouca de tanto gritar que a saúde no nosso país está gravemente doente. E se o Executivo tomar a sábia decisão de retirar as verbas que se escapam do OGE para “Bentos Kangambas e Ca.”, poderemos utilizar o dinheiro – o nosso dinheiro – que viaja em sacos, caixas de sapatos e outros “meios de transporte”, para alimentar o vício, a corrupção e o crime, e emprega-lo bem: no ensino de qualidade para os nossos filhos; numa saúde que dê vida às crianças, jovens, mulheres, homens e velhos, para deixarmos de ter a pouca-vergonha que temos no país. As verbas que este OGE atribui à Educação e à Saúde, continuam a situar-se muito abaixo daquilo que os outros países da região praticam, em termos de percentagem do PIB. E um Executivo que não aposta, DE FACTO, nesses dois sectores nevrálgicos da sociedade não pode aspirar a um desenvolvimento económico que represente uma melhoria real na qualidade de vida dos seus cidadãos.

Senhor Presidente;

Senhores deputados,:

Mais uma vez o Governo vai gastar 381,9 mil milhões Kz, isto é, 5% do OGE, em “outros serviços”, sem especificar quais. Isso é sério?

A UNITA tem estado a alertar, a aconselhar, que é preciso, enquanto há petróleo, utilizar os recursos que ele produz para alavancar outros sectores da economia. É assim que se faz a diversificação da economia. Mas o Executivo não nos dá ouvidos. E o resultado da maldita “petrodependência” é que o preço do petróleo baixou, e a nossa economia treme que nem varas verdes.

E, ao olharmos para esta proposta de OGE, verifica-se que as verbas destinadas à Agricultura voltam a baixar este ano, caindo em 10%, para 53 mil milhões Kz, para um sector de importância estratégica na diversificação da economia e no combate à pobreza. Em 2013, o governo atribuiu à agricultura 1% das receitas. Em 2014, 0.66%, Agora, baixa para 0.6%. E mesmo assim, nós é que andamos na retórica, e os outros no realismo e no pragmatismo!

Senhor Presidente;

Caros colegas deputados,

Esta proposta de OGE é, para não variar, excessivamente optimista e contém conclusões bastante contraditórias face à realidade dos factos:

• Se em 2014 há registo de um desequilíbrio das contas internas e das contas externas, com as primeiras a registar um défice global de 0.2% do PIB, e as segundas a indicarem uma balança de pagamento de 2.7 mil milhões de dólares – o que representa mais de metade do défice registado em 2009, altura em que ocorreu a crise económica mundial;

• Se as exportações petrolíferas caíram em cerca de 4.6% do previsto em 2014 – e tudo indica que esta tendência decrescente irá manter- se ainda por muitos meses, devido ao fraco comportamento das principais economias mundiais, às tensões políticas externas e os factores operacionais negativos no país;

• Se o nível de execução do OGE de 2014 não foi para além dos 81%;

• Se os Programas de Investimento Público foram executados em apenas 71%;

• Se o OGE para 2015, comparativamente ao de 2014, é inferior em 6.5 mil milhões de kwanzas;

• Se o PIB de 2014, que o Executivo previa crescer em 8.8%, ao que tudo indica vai crescer menos de metade disso;

Como entender que, de um contexto tão frágil e fragilizado se possa ter um crescimento do PIB, em 2015, na ordem dos 9.7%, calculado com base num crescimento do sector petrolífero de 10.7% e do sector não-petrolífero de 9.2%?

O OGE para 2015 continua a ser despesista, com despesas correntes superiores às de capital; com muitas despesas ostentatórias que deviam ser reduzidas ou mesmo eliminadas.

Senhor Presidente;

Senhores deputados,

Este OGE continua a ter uma distribuição injusta e desequilibrada das verbas, e a alimentar as assimetrias. O Executivo central continua, continuando a deter 72% das receitas globais, contra 28% para as províncias, chamando a si acções que podiam ficar para o nível local.

Continuam as irregularidades, nalguns casos, e a inexistência, noutros, no fornecimento de água e de energia eléctrica aos cidadãos; Prossegue a má qualidade de prestação de serviços de saúde e de educação; Não há meio de parar a descapitalização dos pequenos e médios empresários; cresce a informalização da economia; do mesmo modo que cresce o desemprego e o subemprego.

Enfim, este orçamento, tal como está, é enganoso, pelo excessivo optimismo com que prevê o crescimento da economia; pelas múltiplas e multiplicadas contradições que comporta, face à realidade económica mundial e nacional.

Senhor Presidente:

Continuamos a ter, para discussão e votação, um orçamento que tem, por objectivos – na óptica do Executivo – a preservação da unidade e coesão nacionais, a melhoria da qualidade de vida dos angolanos, o desenvolvimento do sector privado, entre outros. No entanto, o nepotismo, no exercício do poder, aos mais variados níveis, continua a fazer morada. Há províncias até onde o bolo orçamental é repartido à boa moda do dito francês segundo o qual “les bonnes choses se mangent en famille” – ou seja, “o que é bom, come-se em família”. Nas estruturas do poder ficam empoleirados os irmãos, os cônjuges (no presente ou no passado), os filhos, sobrinhos, os genros, as noras, os cunhados. Abocanham todos os negócios locais, pequenos, médios e grandes; empobrecem propositada e sorrateiramente os pequenos empresários em fase de crescimento e, à boa maneira da máfia italiana, aparecem para lhes comprar o negócio. Santo Deus! É assim que que se pretende desenvolver o sector privado e melhorar a qualidade de vida dos cidadãos, tirando-lhes o pão? Será mesmo para o enriquecimento dessas famílias que nos trazem aqui este orçamento para aprovação? Será que o titular do Poder Executivo não vê isso? Não sabe disso? No debate na Especialidade virão os detalhes.

Senhor Presidente;

do Executivo; deputados, meus senhores:

Senhores membros Caros colegas

Minhas senhoras e

Este Orçamento pretende que se coloque nas mãos do Presidente da República, para gestão, uma “Reserva Financeira Estratégica Petrolífera”, destinada a financiar infraestruturas de base. E esse dinheiro é “parte” da receita resultante dos direitos patrimoniais do Estado nas concessões petrolíferas. Essa receita eleva-se a pouco mais de 19 biliões de dólares! O Presidente da República vai gerir “parte” desse dinheiro, e “parte” pode ser 1%, 50%, 99.99%. Ninguém sabe. Ninguém nos diz nada. É só passar o cheque em branco. E são receitas, pasme-se, para financiar investimentos de longo prazo. E os Deputados autorizam o dinheiro, mas estão proibidos de fiscalizar, de saber como esse dinheiro vai ser gasto.

 

Este Orçamento pretende que o Presidente da República firme qualquer contrato de até 29.99 milhões de dólares sem precisar da fiscalização preventiva, do visto, do Tribunal de Contas; Que o Ministro estabeleça contratos de até 1.59 milhões de dólares, sem o visto desse tribunal, e que o Governador Provincial faça o mesmo, desde que não chegue a um milhão de dólares. Ou seja, para um milhão tem de ter o aval do Tribunal de Contas, mas para 999.999,99 USD, não precisa. Num país onde o Tribunal de Contas tem a falta de força que tem, e os Deputados estão impedidos de fiscalizar a execução do orçamento, a utilização dos recursos, isso parece mesmo um daqueles filmes em que o artista morre no princípio.

Num país que se diz “democrático”, “de direito” e “transparente”, este orçamento pretende que as “despesas especiais” , afectas aos órgãos de soberania e serviços públicos que realizam funções de segurança interna e externa do Estado, tenham um regime especial em termos de cobertura, execução e prestação de contas. O Orçamento inscreve “Fundos Financeiros Especiais de Segurança”, que vão funcionar como “reserva estratégica do Estado”, para a realização dessas “despesas especiais”, e só o Presidente da República, enquanto Titular do Poder Executivo, é que vai dizer como é que se poderá fazer a prestação de contas. Ou seja, o fiscalizado é que determina o modo de fiscalização.

Mais uma vez, este OGE para 2015 pretende que os Deputados autorizem o Titular do Poder Executivo a conceder garantias do Estado a operadores económicos nacionais num limite de 247 biliões e 750 mil Kwanzas. Ou seja, 2.5 biliões de dólares.

Isso é novo? Claro que não é! O que preocupa o Grupo Parlamentar da UNITA é o facto de que, sem autorização deste Parlamento, o Presidente da República ultrapassa esses limites, violando a Lei. Foi assim com o Banco Espírito Santo Angola, S. A., quando o Senhor Presidente, por Despacho Interno No 7/2013, de 31 de Dezembro, que nem sequer foi publicado em Diário da República, como mandam as regras, ordenava o Ministro das Finanças a emitir uma garantia autónoma de até 5.7 biliões de dólares, ultrapassando em cerca de 2 biliões de dólares o limite estabelecido por lei. E isso, sem que a Assembleia Nacional tivesse sido solicitada a pronunciar-se sobre o facto. Na língua ibinda diz-se “M’kuluntu tshinzikya mwana ileze; mwana ileze ivandi tshinzikya m’kuluntu”. “É preciso que o mais velho respeite o mais novo, para que este respeite o mais velho”. Será assim que o mais velho respeita o mais novo?

Senhores deputados:

Os angolanos estão muito preocupados, porque:

Há um Banco em Angola que diz não saber a quem emprestou mais de 4 biliões de dólares, que no entanto, desapareceram;

Há um grande silêncio sobre quem são os donos angolanos desse banco, quem são as pessoas que ficaram com o dinheiro desse banco; Há uma intervenção não transparente do Executivo para o resgatar, utilizando fundos não autorizados do Tesouro Nacional;

 

• Os angolanos estão muito preocupados porque o problema parece não afectar apenas o BESA mas igualmente que,

outras instituições financeiras no país, coisa que levou o BNA a preocupar-se com a qualidade dos activos dos Bancos, sua solvabilidade e sustentabilidade, e a proceder à “avaliação específica e independente da qualidade dos activos de todas as instituições financeiras bancárias que operam no mercado nacional”.

Ora, se essa avaliação foi feita ou não, a verdade é que os seus resultados não foram ainda transmitidos aos angolanos.

Preocupado com o caso “BESA”, a UNITA, através do seu Grupo Parlamentar, solicitou, em Agosto último, a realização de um inquérito parlamentar que permitisse esclarecer, de uma vez por todas, o que se teria passado com o BESA e os “quês” e “porquês” por detrás do socorro dado pelo Presidente da República, da forma como o deu. Três meses depois, os nossos colegas do MPLA na 1a, 4a e 5a Comissões consideram que a nossa iniciativa é “extemporânea”, que o nosso pedido de inquérito é “improcedente”, porque o Tribunal Constitucional terá dito, através do seu Acórdão no 319/2013, que o Deputado não tem nada que questionar o que o Executivo faz.

Em Portugal, uma Comissão Parlamentar de Inquérito à gestão do BES e do Grupo Espírito Santo tem início no dia 17 deste mês de novembro, ou seja dentro de 4 dias. Durante 60 dias, essa CPI pretende ouvir 119 pessoas de entre as quais o Senhor Governador do nosso Banco Nacional de Angola. E eu pergunto: vai ou não vai?

Senhor Presidente;

Os angolanos todos, que nós representamos, estão preocupados com a integridade das transações previstas no OGE e com a verdade e a transparência do orçamento.

E não há melhor instrumento para a transparência da administração do que a prestação de contas dos actos por ela praticados, que se traduza pela demonstração correta e sincera, a todo o momento, do que a administração vem fazendo pela coletividade.

E nesse sentido, cumpre-me informar a esta Assembleia que, nos termos da alínea (h) do número 1 do artigo 32o da Lei n.o 13/12, de 2 de Maio, que confere aos Grupos Parlamentares o direito de serem informados, directamente pelo Executivo, sobre o andamento dos principais assuntos de interesse nacional, o Grupo Parlamentar da UNITA remeteu uma carta ao Titular do Poder Executivo a solicitar informações pertinentes de interesse nacional subjacentes ao dossier BESA/BANCO ECONÓMICO, nomeadamente:

 

a) A natureza do ‘problema’ existente na sua carteira de créditos, conforme referiu o Senhor Governador do BNA, ao Parlamento, no passado dia 24 do mês de Julho;

b) A natureza e a extensão das irregularidades e inconformidades detectadas pelo BNA, conforme referiu, igualmente, o Senhor Governador;

c) A identidade dos seus accionistas e evidências da probidade e legitimidade da origem dos recursos investidos;

d)O estudo de viabilidade que sustentou a decisão de investimento no BESA/BANCO ECONÓMICO tomada pela Concessionária nacional de hidrocarbonetos líquidos e gasosos;

e) Em que medida a garantia fornecida pelo Estado angolano, a favor do BESA, foi efectivamente executada e de que modo;

f) Em que medida a concessão ou execução da referida garantia protegeu de facto o interesse público de Angola ou, pelo contrário, o interesse privado do BESA/BANCO ECONÓMICO, seus accionistas, seus gestores ou seus devedores;

g) Em que medida a utilização feita da autorização concedida ao Titular do Poder Executivo para emitir garantias do Estado no quadro das operações de crédito previstas no OGE de 2013 ou de 2014 transforma os Deputados em cúmplices dos crimes de enriquecimento ilícito, branqueamento de capitais ou de improbidade pública que venham a ser imputados a qualquer dos intervenientes no quadro das investigações em curso pelos órgãos de justiça de Portugal.

Mas o caso BESA ainda nem está esclarecido e já se ouve dizer que mais uma garantia soberana terá sido emitida a favor da BIOCOM, que parece ter esbanjado o seu capital e pediu socorro ao Titular do Poder Executivo. Talvez o senhor Ministro das Finanças tenha alguma coisa para nos dizer sobre o assunto.

Senhor Presidente;

O Tribunal Constitucional considera que a aprovação do OGE, pela Assembleia Nacional, constitui um dos principais mecanismos de fiscalização preventiva e de controlo à priori dos actos do Executivo.

Considera que o princípio da separação de poderes parte do pressuposto de que, para que exista liberdade num Estado de Direito, é imperioso que os poderes Legislativo, Executivo e Judicial não se concentrem num único órgão, devendo ser repartidos por órgãos diferentes, para que cada um deles, sem usurpar a função dos outros, possa impedir que os restantes ultrapassem a sua esfera de acção, tendo a faculdade de estatuir sobre as matérias da sua competência, tendo também a faculdade de impedir que os outros poderes pratiquem actos contrários ao direito ou ao equilíbrio constitucional.

A Assembleia Nacional pode e deve fazer isso.

É sentimento geral da grande maioria dos angolanos que o país deve conceber mecanismos eficazes de combate à fuga de capitais, à sobrefacturação de bens e serviços; ao enriquecimento ilícito, aos preços exorbitantes, aos milhares de fantasmas incluídos nos bancos de dados das remunerações, enfim, deve combater a corrupção institucionalizada.

Assim, cumpre-me anunciar aqui que, no quadro da reforma do quadro orgânico da Assembleia Nacional, o Grupo Parlamentar da UNITA irá propor a criação de um Gabinete Técnico Especializado que terá por missão apoiar a Assembleia Nacional no exercício das suas competências ligadas à aprovação do Orçamento Geral do Estado e da Conta Geral do Estado, mais concretamente para, entre outros:

avaliar o cumprimento dos objectivos previstos nos Planos de Desenvolvimento, a execução dos programas de governo e dos orçamentos da República;

comprovar a legitimidade, a economicidade e a legalidade prévia, concomitante e subsequente das receitas e despesas previstas no OGE;

avaliar os resultados, quanto à eficácia e à eficiência, da gestão orçamental, financeira e patrimonial relativa à aplicação de recursos públicos, objecto de orçamentação;

avaliar a economicidade e exercer o controle das operações de crédito, avais e garantias inseridas no OGE.

Outra medida de racionalização e controlo da despesa pública que iremos propor á a institucionalização das autarquias. Institucionalizar as autarquias é multiplicar os centros de controlo orçamental, que são as Assembleias Municipais.

Isso pode ser feito, com o mesmo “realismo” e “pragmatismo” que aconselha o senhor Presidente da República. Não há dúvidas que as autarquias aumentam a transparência, estimulam o desenvolvimento, esbatem as assimetrias, permitem uma governação melhor, proporcionam melhor qualidade de vida aos cidadãos. Já no texto constitucional de 1992 estavam previstas as autarquias, ficando o seu conteúdo e as suas atribuições melhor esclarecidas na Constituição de 2010. Ora, 22 anos depois, ainda vamos falar em “realismos” e “pragmatismos” que empurrem a institucionalização das autarquias para lá de 2017? Quando o Senhor Presidente da República se apresentou aos angolanos, em 2012, como candidato à sua própria sucessão, prometeu que, durante o seu mandato, realizaria eleições autárquicas. Se, como é hábito dizer-se, “palavra de rei não volta atrás”, como pode hoje o Senhor Presidente dizer que “Não”! “Eleições autárquicas, antes de 2017, nem pensar”?

Temos estado a assistir à representação teatral de muitos “advogados do diabo” que querem inventar um “gradualismo” diferente do existente na Constituição, escrito em português compreensível, fácil de digerir, e que se refere ao “alargamento das atribuições” desses entes autónomos. Para esses “especiólogos” – e aí vai mais um termo – pode-se violar o princípio da igualdade constitucional, e até mesmo passar do “gradualismo” para um verdadeiro “imobilismo”, que é o que vivemos hoje, enquanto o Grupo Parlamentar maioritário resolve adoptar a posição de verdadeiro travão. Ora, se o caminho faz-se caminhando – como diz repetidamente um meu amigo do MPLA – como é que o Executivo quer caminhar parado?

Alega-se falta de condições materiais, técnicas, legais e outras para fugir às eleições autárquicas. Na altura da assunção do poder em Angola, a 11 de novembro de 1975, em que instituição se terá ido fazer um curso intensivo de Presidente da República, de Ministro, de Comissário Provincial (hoje Governador), de Administrador, etc? Onde? Porque razão apenas as autarquias representam problema?

Meus Senhores, o problema é outro. É saber que, na impossibilidade de se ganhar todas as autarquias no país, se veja parte do poder, quer político, quer económico escapar-se das mãos. E quando se está habituado a controlar todo o poder e o poder todo, isso representa um verdadeiro dilema.

Senhor Presidente;

Senhores deputados:

Os angolanos têm estado a exprimir fortes receios que haja intenções de se chegar ao quinto ano de vigência da Constituição – o que ocorre dentro de menos de 3 meses – para se apagar as autarquias da Constituição. Nós ousamos pensar que isso não vai acontecer. Os limites materiais estabelecidos no Artigo 236o da Constituição, impedem que se mexa nos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos; na eleição, por sufrágio universal, dos órgãos das autarquias; e, sobretudo, na autonomia local. Mas, como dizia, ousamos apenas, se tivermos em conta que os limites materiais estabelecidos na Lei Constitucional de 1992 foram abalroados, atropelados na feitura do actual texto constitucional, nomeadamente no que diz respeito à eleição presidencial, à forma dessa eleição, e à participação na mesma. E quem violou os limites materiais ontem pode bem voltar a violá-los amanhã.

Senhor Presidente;

Senhores membros do Executivo; Caros colegas

deputados, Minhas senhoras e meus senhores:

A discussão de mais este OGE surge no momento em que os direitos dos trabalhadores angolanos são sistematicamente pisoteados. Foi caso dos trabalhadores da Clínica Girassol, destratados como se fossem meros objectos descartáveis; é o caso das dezenas de trabalhadores da TCUL, expulsos do seu emprego já precário, por fazerem recurso ao direito constitucional à greve, acusados de serem da UNITA – note-se esta grande demonstração de “reconciliação nacional”! – e substituídos por indivíduos que se diz serem da UGP e da Polícia; é o caso dos trabalhadores da SONANGOL na Huíla, postos na rua sem o mínimo ressarcimento; é o caso dos professores filiados no SIMPOF na Huíla ou noutros pontos do país, espancados e impedidos de exercer o seu direito de greve ou de manifestação, nesta “grande democracia” em que vivemos.

Estamos a debater este OGE numa altura em que o meu colega de Grupo Parlamentar, o Deputado Liberty Chiyaka, escapou por um triz de um atentado, cujos autores, tanto o material como o moral são conhecidos, têm nome, mas agora se pretende fingir que se teria tratado apenas de uma tentativa de roubo, apesar de o autor material ter confessado o crime e pronunciado, alto e bom som, o nome de quem o tinha mandado atentar contra a vida do meu colega. E dizem-nos que a intenção é “preservar a unidade e a coesão nacionais”. Enfim!...

O meu colega do Grupo Parlamentar do MPLA virá dizer o resto. Muito obrigado, Senhor Presidente.

GRUPO PARLAMENTAR DA UNITA, 13 DE NOVEMBRO DE 2014