Luanda - 1 . O PR, José Eduardo dos Santos (JES) pôs em causa a honestidade de “muitos“ membros do actual Governo quando, um tom descrito como excepcionalmente áspero, se referiu à existência de governantes “pouco sérios” e duvidosamente aplicados na resolução dos problemas globais do país.

Governantes e governação alvo de críticas internas de JES

Advertiu ter conhecimento de casos de desvio de fazenda e bens públicos em proveito privado, que pela sua natureza disse serem passíveis de apresentação à Justiça. Apontou, como exemplo concreto de sobrefacturação, o caso da reabilitação do antigo Liceu Salvador Correia, em Luanda, obra orçamentada em USD 156 milhões.

O episódio, ocorrido numa reunião extraordinária do Conselho de Ministros (CM), 03.Jul, deu “seguimento” a desabafos críticos de JES, até então apenas manifestados em ambientes mais recatados, no que concerne à acção do Governo e da administração pública – no seu próprio entender “negativa”, devido a factores como incompetência e venalidade de responsáveis e altos quadros.

2 . JES queixava-se amiúde, em reuniões internas mais restritas (BP do MPLA), de “graves problemas” registados na gestão do Ministério das Finanças enquanto à frente do mesmo esteve José Pedro Morais. Retomou a crítica na reunião do CM para exortar o PM, Paulo Kassoma, a redobrar atenção à acção dos governantes.

O balanço negativo que JES faz da acção governativa e do funcionamento da administração, como realidade de que resultam ilícitos proveitos individuais e/ou de grupo, em detrimento do bem estar das populações desfavorecidas, cujas condições básicas de vida não têm sido satisfeitas, apoia-se em dois factores:

- Observações próprias; estudos de situação considerados minuciosos (um dos quais elaborados por consultores externos).
- Testemunhos/relatos provindos de personalidades idóneas que recebe.
JES tem sido prevenido para factos como o de os responsáveis da actual administração, em todos os escalões, serem incompetentes – um fenómeno para o qual são remetidas “perversões” tais como uma diminuta absorção do conceito do interesse nacional e deficiente espírito de desenvolvimento, com alheamento do bem comum.
A presente degradação do funcionamento da administração e das instituições em geral é considerada reflexo da combinação de factores como os seguintes:
- Hemorragia de quadros mais válidos, atraídos pela vida privada.
- Diluição do espírito de competição com a UNITA que prevaleceu até às últimas eleições, com reflexos de relaxamento e de impunidade nos quadros do MPLA.
- Deslumbramento megalómano face aos recursos do país.

3 . JES remete para o mau funcionamento da administração o surgimento fenómenos de descontentamento na sociedade – uma constatação enfatizada na reunião do CM pelo ministro Defesa, Kundy Payhama (no seu estilo próprio chegou a considerar providencial a não realização de eleições presidenciais em 2009 “por que podíamos levar uma cabazada”).

Tendo em conta recorrentes métodos de acção de JES, o episódio do CM é interpretado como prenúncio de mudanças internas por ocasião do Congresso do MPLA, Dez.2009, e depois dele – para o que começou a ser criado ambiente propício. As referências explícitas a JP Morais visam aparentemente exasperá-lo, com o fito de o obrigar a reagir e a fazer disso pretexto para uma exploração política do caso.

Também se conjectura que a atitude crítica de JES em relação à realidade da corrupção, já referenciada do antecedente (AM 353), visa igualmente desviar noutras direcções especulações que sobre ele próprio recaem, bem como a apresentá-lo, interna e externamente, como figura íntegra.

4 . Em meios do regime considerados contrários a JES, este é apontado como responsável pelo estado actual da administração – não apenas pelo consentimento dado a nomeações consideradas negativas, como passividade face a outras, em geral agindo com base em critérios de confiança pessoal, lealdade e satisfação de interesses dos vários grupos do poder.

Exemplos apontados da conduta de JES, ambos no sector financeiro:
- A nomeação de R Viegas de Abreu como vice-governador do BNA; é pouco considerado em meios do regime e da sociedade, devido a casos muito propalados do seu passado, tidos como pouco abonatórios.
- A protecção e/ou a complacência que dedica a figuras do seu círculo, afastadas sob pressão de suspeitas de implicação em irregularidades no exercício de funções de elevada responsabilidade; apontado o caso de Amadeu Maurício, ex-governador do BNA (irmão de António Maurício, membro da direcção da FESA, responsável pela Soninvest, “branch” dos negócios da mesma).

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Fonte: Africa Monitor