Lisboa - Esta semana o deputado da UNITA David Mendes afirmou “Que estava farto dos Portugueses”, o que não me surpreende pois nem todas as verdades são agradáveis de ouvir. Tenho de tirar o chapéu a este deputado pela coragem que teve para o dizer alto e em bom som o que sente e podem crer que não é uma voz solitária. Este sentimento é partilhado por uma grande maioria dos negros angolanos sem excepção, tendo esse sentimento ficado devidamente provado quando no ano de 1975 arranjaram maneira de correr com cerca de 750 mil portugueses de Angola. É bom que nós Portugueses nos consciencializemos disso, e que não vivamos enganados de que os 500 anos de colonialismo já foram facilmente esquecidos.

Fonte: Facebook

Os angolanos teimam em afirmar que Angola não foi descoberta por Diogo Cão, pois já existia um território ainda não com esse nome o qual já era habitado por autóctones o que é verdade. Talvez esta afirmação possa em parte ser assertiva, portanto quando nós portugueses, espanhóis, franceses, holandeses e ingleses nos referimos a ter dado novos mundos ao mundo no período das descobertas, em boa verdade não descobrimos nada, apenas viajamos de barco pelos diferentes oceanos de um mundo cartograficamente desconhecido a espalhar padrões por terras inóspitas de baixo índice populacional e povoadas com pessoas em estados civilizacionais muito primários afirmando arrogantemente pelas forças das armas, chicote e bíblia pertencerem à coroa portuguesa. Para nos outorgarmos a reclamar ser detentores de um território o mesmo precisa de se encontrar desabitado, pois se o for, então passará a ser considerado conquistado se a presença dos recém-chegados for imposta e contestada pelos autóctones.


O reino de Angola estava delimitado e povoado, portanto nós portugueses não fomos lá descobrir nada em Angola ou nas outras colónias. Nenhuma das potências colonizadoras entre os séculos XV e XVI descobriu o que quer que fosse, pois tudo já existia dentro de um planeta chamado terra habitado por seres humanos de cores epidérmicas e estruturas anatómicas diferentes em estágios civilizacionais diferentes, mas bem longe dos europeus. Portanto o mito áureo do nosso período das descobertas aparentemente é uma falsa verdade, não parimos nada de novo, pois tudo o que afirmamos ter descoberto já existia e era habitado. Este longo introito vem desaguar nas palavras Colonizador e Colono as quais pretendo dissecar nas suas duas vertentes. Gramaticalmente existe uma diferenciação entre colonizador e colono. Colonizador é a entidade ou país que que se instala numa região fora da sua zona territorial com a finalidade de pela forma administrativa ou militar promover a colonização e explorar os autóctones e as suas riquezas naturais. Enquanto que colono é aquele que de forma privada e voluntária ou oficial é inserido em uma área juntamente com outros com a finalidade de povoar e trabalhar, assim como conviver e ser membro da colónia. Erradamente os angolanos devem conscienzalizar-se e assumir de que os verdadeiros colonos esclavagistas foram os árabes e não os portugueses, estes apenas serviram de intermediários a partir do século XVI.


Na minha opinião a cor da pele não define o termo de colono ou esclavagista pois ele tanto pode ser branco, negro ou amarelo. Só porque alguém é negro nascido em Angola não lhe confere o direito de chamar a quem quer que seja de outra raça colono. A raiz ancestral dos humanos é diferente bem como as suas heranças genéticas, históricas, sociais, e culturais dependendo dos locais do mundo onde nascem. No tempo dos navegadores elas eram impostas pela força aos povos em estágios ainda primitivos obrigando-os a assimilar as culturas e linguagem e religiões dos países conquistadores essa a razão pela qual existem imensos país em África de cultura Islâmica, pois estes chegaram ao continente muitos séculos antes dos europeus.


Na minha opinião a definição de Colono não está na naturalidade ou nacionalidade, mas sim na forma política, social, comportamental de igualdade, liberdade, fraternidade, solidariedade e justiça em relação a todos independentemente da sua cor, credo ou religião. Antes de os europeus se aventurarem pelos mares já os Fenícios o tinham feito há cerca de 3.500 anos antes sendo considerados a maior potência naval do mundo. Os fenícios navegaram pelo Mediterrâneo e Atlântico fazendo extensas viagens ao longo da costa da África estabelecendo feitorias comerciais. A mais famosa delas foi Cartago, localizada no que é agora a Tunísia, norte da África, estabelecida algum tempo após 800 d. C. Eventualmente, tornar-se-ia uma grande cidade, tão grande que desafiou o império mais poderoso do mundo antigo: Roma. Durante séculos, milhões de africanos subsarianos foram vendidos como escravos no Norte de África, e entre os anos 650 e 1800, foram vendidos como escravos 17 milhões de africanos provenientes das terras ao sul do deserto do Sarah. Os compradores vinham do Egipto, Sudão, Líbia e Marrocos comprá-los aos mercados de escravos. O tráfico de escravos africanos controlado pelos árabes foi o mais longo da história da escravatura, começou no sétimo século e mantêm-se até aos dias de hoje em territórios controlados pelo DAESH e ISIS sob a bandeira do Islão. O comércio árabe de negros na costa Oriental e Ocidental de África precede o comércio transatlântico europeu de escravos em 700 anos.


Alguns historiadores estimam que entre os anos 650 e 1900, entre 10 a 20 milhões de pessoas foram escravizadas por negreiros muçulmanos árabes. Outros acreditam que mais de 20 milhões de africanos foram vendidos como escravos, através da rota trans-sahara, apenas para satisfazer a procura deles no mundo islâmico. Para fins comparativos, calcula-se em cerca de 10 milhões o número de africanos que chegaram às Américas como escravos e que muitos milhões morreram pelo caminho de doenças nos porões dos navios. O tráfico de escravos árabes era preferencialmente do sexo masculino e castrados. Os meninos pretos, entre a idade de 8 e 12, tinham seus escrotos e pénis completamente amputados para impedi-los de se reproduzirem. Cerca de seis em cada dez meninos sangravam até a morte durante o procedimento, mas o alto preço obtido por eunucos no mercado tornou a prática lucrativa.


Alguns homens foram castrados para serem eunucos no serviço doméstico e a prática de esterilizar os escravos do sexo masculino não se limitava apenas aos homens pretos. Um califa em Bagdad, no início do século X, tinha 7.000 eunucos pretos e 4.000 eunucos brancos em seu palácio. O Comércio árabe de escravos inspirou o racismo árabe contra pretos africanos. Ter pele preta e ser negro implicava ser inferior e para esse efeito criaram-se atitudes racistas que se manifestaram na língua e na literatura árabe.


A palavra Abid significava escravo tornou-se um coloquialismo para africanos, bem como Haratin que denegride a inferioridade social dos africanos. O comércio de escravos árabe na África oriental de mulheres e meninas eram destinadas a serem usadas por árabes e outros asiáticos como concubinas e servas. Um negreiro muçulmano tinha direito por lei ao gozo sexual de suas mulheres escravas. Os haréns de árabes ricos estavam cheios de mulheres africanas as quais geravam imensos filhos. Os estupros e outras violências contra mulheres africanas continuaria por quase 1200 anos. O comércio árabe de escravos era a fonte de fornecimento dos europeus, pois eram estes que os arrebanhavam pelos sertões africanos com a finalidade de os venderem aos entrepostos controlados pelos negreiros em Zanzibar, Gana, Senegal, Benim e Angola. O comércio transatlântico de escravos proporcionava novas oportunidades de exploração, os portugueses na costa Oriental associados aos árabes foram responsáveis por um crescimento no comércio esclavagista.


Enquanto isso, na costa da África Ocidental, os portugueses encontraram comerciantes muçulmanos entrincheirados ao longo da costa africana até a baía de Benim. Estes negreiros europeus descobriram que podiam fazer quantidades consideráveis de ouro transportando africanos escravos de um posto de comércio a outro, ao longo da costa atlântica. O abolicionismo foi um movimento político que visou à abolição da escravatura e do comercio de africanos, desenvolveu-se durante o Iluminismo do século XVIII e tornou-se uma das formas mais representativas do activismo político do século XIX até a actualidade.


Decorria o reinado de D. José I, quando, em 12 de fevereiro de 1761, a escravatura foi abolida por Marquês Pombal na Metrópole e na India. Contudo só pelo decreto de 1854, os primeiros escravos a serem libertados foram os do Estado e mais tarde vergonhosamente os da Igreja pelo decreto de 1856. E, com a lei de 25 de fevereiro de 1869 proclamou-se a abolição da escravatura em todo o Império Português. Portugal foi o primeiro estado do mundo a fazer comércio global de escravos vindos de África, e, entre 1450 e 1900, estima-se que os negreiros e traficantes de carne negra tenham trazido para Portugal e enviado para o Brasil, Caraíbas e América cerca de 11 milhões de pessoas. Apesar da mitologia histórica nacional gostar de exibir o galardão de ter sido o primeiro país do mundo a abolir a escravatura não nos livramos de ter sido os pioneiros a implementá-la.

15-12.2018
António José Canhoto.