Luanda - Um movimento independentista do enclave angolano de Cabinda acusou hoje Portugal de ter "traído" por duas vezes o povo cabindês, ao "oferecer" o território a Angola em 1975 e "persistir no silêncio", ignorando o definido no Tratado de Simulambuco.

Fonte: Lusa

As acusações constam num comunicado do "Governo Provisório" da Frente de Libertação do Estado de Cabinda (FLEC), no qual se assinalam os 134 anos da assinatura do Tratado de Simulambuco (1 de fevereiro de 1885), documento que "é e será o manifesto secular da identidade do povo de Cabinda e a afirmação da sua soberania como Nação".

"A 1 de fevereiro, o povo de Cabinda comemora duas traições. A primeira traição foi quando os portugueses decidiram ignorar as aspirações do nosso povo oferecendo Cabinda a Angola em 1975. A segunda traição é de os portugueses persistirem ainda hoje no silêncio ignorando os compromissos que assumiram com o povo de Cabinda quando assinaram o Tratado de Simulambuco", refere-se na nota.

No comunicado, assinado pelo secretário para a Informação e Comunicação e porta-voz da FLEC/Forças Armadas de Cabinda (FLEC/FAC), Jean Claude Nzita, enviado hoje à agência Lusa a partir de Paris, o movimento independentista acusou também Portugal de "conspurcar" a sua História, os seus compromissos e a sua honra".

A FLEC/FAC sublinhou que "134 anos depois, Cabinda continua algemada ao colonialismo, não dos portugueses, mas dos angolanos" e que, "134 anos depois, Cabinda, continua a ser humilhada e o seu povo reprimido, privado de liberdade e de palavra. Mas, 134 anos depois, Cabinda mantém-se erguida contra a tirania, a opressão e a ocupação".

"Somos um povo nobre que assinou um nobre Tratado. Somos um povo que permanece erguido e firme na resistência contra todos os opressores", pode ler-se na nota.

Segundo o comunicado, a FLEC/FAC exorta o povo cabindês a "manifestar orgulho nas suas origens, identidade, história, dignidade e acreditar que a (...) maior força está na unidade e no combate armado ou pacífico para que sejam cumpridas as (...) aspirações e honrados os (...) antepassados".

A FLEC não faz qualquer referência à celebração da efeméride em Cabinda, com o Movimento Independentista de Cabinda (MIC), outra organização separatista, a convocar para hoje uma "marcha pacífica" para assinalar a data, apesar de não estar autorizada.

Quinta-feira, em declarações à Lusa, Sebastião Macaia, secretário para a Informação do MIC, indicou que foi entregue às autoridades locais a documentação a dar conta da marcha e denunciou que as forças de segurança angolanas prenderam terça-feira 32 membros da organização, pelo que a iniciativa servirá também para exigir a libertação imediata dos detidos.

Entre os detidos, referiu Macaia, está também o secretário adjunto para a Informação do MIC, António Vítor Puma, que se encontra numa das prisões do enclave angolano que faz fronteira com a República do Congo e com a República Democrática do Congo.

O Tratado de Simulambuco foi assinado a 01 de fevereiro de 1885 pelo representante do Governo português Guilherme Augusto de Brito Capello, então capitão tenente da Armada e comandante da corveta Rainha de Portugal, e pelos príncipes, chefes e oficiais do reino de N`Goyo.

O tratado colocou Cabinda sob protetorado português e foi elaborado antes da Conferência de Berlim, que dividiu África pelas potências europeias.

A procura da independência data, no entanto, de 1956, quatro anos depois da união administrativa com Angola, com a formação do Movimento de Libertação do Enclave de Cabinda (MLEC) e, em 1963, dois anos depois do início da guerra em Angola, são criados o Comité de Ação da União Nacional dos Cabindas (CAUNC) e a Aliança Maiombe (ALLIAMA).

A Frente de Libertação do Enclave de Cabinda (FLEC) é fundada nesse mesmo ano, como resultado da fusão dos movimentos existentes e de forma a unir esforços que sensibilizassem Portugal para o desejo de independência. Mais recentemente, a FLEC passou a designar-se Frente de Libertação do Estado de Cabinda.

A Lusa tem tentado contactar o governo provincial de Cabinda, mas ainda não obteve nenhuma resposta.