Luanda - NO DERRADEIRO ADEUS AO DR. JONAS MALHEIRO SAVIMBI


À família umbilical do Dr. Jonas Savimbi;
Às maninhas e aos maninhos da nossa grande UNITA;

Aos amigos da UNITA e do Dr. Savimbi, de dentro e de fora: Venho aqui, hoje, neste momento de solenidade única, para prestar um testemunho. Faço-o agora porque não teria outra oportunidade para o fazer, pois este momento é único.


Eu podia ter vindo para aqui falar de improviso, como muitas vezes faço. Mas eu achei por bem escrever este testemunho, este depoimento, porque a carga emocional para qualquer dos presentes é enorme. E eu sublinho “qualquer dos presentes”. Isso porque, nem 100 anos Deus nos vai conceder o privilégio de criar um outro Jonas Savimbi. Tivemos este que estamos a homenagear aqui, que Deus criou e trouxe ao mundo a 3 de Agosto de 1934, que os homens assassinaram a 22 de Fevereiro de 2002 (68 anos depois de ter vindo ao mundo), e, muito infelizmente pata todos nós, não será nos próximos 100 anos que teremos outro. O Dr. Savimbi é uma daquelas “peças únicas” que Deus cria. Por isso, fiquei tomado de um receio enorme que as palavras me fugissem, me faltassem, para dizer o que eu me predispus a vir aqui dizer.


Nascido no Malembo, Cabinda, há 61 anos, eu pensava ser um “revolucionário” até viajar de Kinshasa para o Likuwa, Território Livre de Angola, em 16 de Dezembro de 1984, já lá vão praticamente 35 longos anos, e logo depois de ter aterrado, fazer uma longa viagem de carro até à Jamba, o Bastião da Resistência. Na altura, o Aeroporto Comandante Kazombuela, da Jamba, não existia. Muito provavelmente existisse já na mente do Dr. Savimbi.


Apesar de já estarem na luta patriótica e revolucionária os meus tios Miguel N’Zau Puna (então Secretário-Geral da UNITA, amigo e confidente do Dr. Savimbi) e António Dacosta Fernandes (Cofundador da UNITA e Secretário para as Relações Exteriores do Partido), eu fui ao Território Libertado de Angola por causa da admiração sem paralelo que sempre nutri pelo Velho Jonas. Queria saber quem era esse homem e o como conseguia ele resistir à poderosa União Soviética e ao Exército Expedicionário Cubano. Confesso que não me preocupei muito com o MPLA e as FAPLA, porque me pareciam mais um “tigre de papel” do que uma ameaça real aos desígnios patrióticos e revolucionários perseguidos pela UNITA. E é esse sentimento que me fez largar o Instituto Superior de Técnicas Aplicadas, em Kinshasa, República do Zaíre, na altura (agora RDC), onde estava prestes a começar o último ano da licenciatura em Electrónica Industrial, e voar para as Terras Livres de Angola.


Do Likuwa fui à Jamba, na companhia de Filipe Chimpolo (que faleceu Deputado do Grupo Parlamentar da UNITA, depois de ter sido Secretário Provincial do nosso Partido em Cabinda), o Franque (irmão do nosso saudoso Comandante José Lelo), o Bartolomeu e o Rafael. Os três últimos, por coincidência ou não, todos eles meus parentes, foram os percursores da luta armada em Cabinda, sob comando do então Coronel Ndjele, agora General, que tive o grato praze4r de rever aqui mesmo neste acto.


Alguns dias após a nossa chegada, o Dr. Savimbi pedia que eu fizesse um “EEI” sobre Cabinda, descrevendo a situação política, económica, cultural, social de Cabinda. Depois de 4 dias, apresentei o trabalho e o Dr. Savimbi, do alto da sua incomparável honestidade intelectual, gostou.


A experiência político-revolucionária foi ganha quando, em 1985, me juntei ao então Coronel Kamalata Numa (por orientação do Dr. Savimbi) para fazer parte da sua coluna na abertura da Frente Centro-Sul. E foi aqui que experimentei o meu baptismo de fogo, durante o longo mas bem sucedido assalto ao posto de Vissati, no Kuando Kubango. Foi igualmente nessa longa caminhada que palmilhei o Kuando Kubango, o Cunene, a Huíla, o Huambo, o Bié e o Saliente do Cazombo, no Moxico.


Trabalhei depois com os manos General Wambu e Zacarias Mundombe, na Contrainteligência Militar. Aí, tive a subida honra de, por ordem do Alto Comandante, ser parte da equipa que assumiu a grande e gratificante responsabilidade de traduzir o manual de utilização do eficiente e determinante Míssil STINGER, que viria a trazer um desequilíbrio na correlação de forças entre as FAPLA, do MPLA, e as Forças Armadas Patrióticas e Revolucionárias de Libertação de Angola – FALA.


Algum tempo depois integrei a coluna do Velho Jonas, quando vim “descobrir” o Bié, depois da passagem fugaz, com o Coronel Numa (mais tarde General), para a abertura da Frente Centro-Sul.


Por decisão e orientação do Dr. Savimbi, eu era quem traduzia os seus discursos, as suas conferências de imprensa, as suas entrevistas, de uma para outra das seguintes línguas: Francês, Inglês e Português.


Com o companheiro Franco Marcolino Nhany, agora Secretário Geral do Partido, comecei o profissionalismo jornalístico, na VORGAN, em 1985. Do programa em língua nacional Ibinda, viria a chefiar a Redacção Central de Notícias, o Programa Internacional em Inglês e Francês; viria a ocupar-me do programa Rádio Escuta, treinado pelo saudoso mano Zito Calhas e, na sequência do 7º Congresso do Partido, realizado na Bêmbua, viria a tornar-me Director Geral da Informação da UNITA, membro, portanto, da Direcção do Partido.


Lembro-me que, ao sugerirmos que, em vez de dizermos constantemente “Voz da |Resistência do Galo Negro”, passássemos a dizer apenas “VORGAN”, o Velho Jonas gostou e assim ficou adoptado.

Dr. Savimbi,


Vós fizestes de mim o revolucionário que sou. Aprendi de vós esta teimosia que carrego comigo de nunca me contentar com o resultado que alcançasse, pois ensinastes-me que é sempre possível fazer melhor e aproximarmo-nos do perfeito, mesmo sendo inexistente.


Em cada discurso seu, em cada comício dos muitos que tive o privilégio de seguir, aprendi, tal como muitos companheiros, muita coisa.


Formastes-me não para ser perfeito, mas para ser o melhor que eu pudesse ser.


No percurso para a procura da impossibilidade de ser igual a vós, cometi erros. Quando, em 1992, vos mandei a carta a dizer que não queria sair da Jamba só porque os meus queridos tios o tinham pedido, pois eu tinha seguido uma causa e não pessoas, dissestes-me, em audiência, na noite do mesmo dia, que o melhor para a Revolução triunfante era eu sair da Jamba, do Território Libertado da UNITA. O Dr. Isaías Samakuva, hoje Presidente da UNITA, o mano Álvaro Mussili, que tive o enorme prazer de rever, na altura vosso Director de Gabinete, a mana Tita Malaquias, e muitos outros companheiros podem testemunhar isso, caso se queiram cobrir de honestidade revolucionária para o fazer. Na altura, vós dissestes: “Maninho Danda (pois era assim que o Dr. Savimbi me chamava sempre), para bem do Partido, o melhor é o maninho sair para que não se diga que o maninho foi forçado a dizer isso”. E eu cumpri. Só não sabia que não tinha sabedoria suficiente para perceber que eu era apenas ”Raúl Danda” e nunca poderia ser nem o Dr. Savimbi, nem algo equiparado.


Cometi erros. Falhei em relação a vós. Falhei pelo que não fiz mas deveria ter feito, e pelo que fiz e nunca deveria ter feito. Falhei porque, muito infelizmente, eu me tinha esquecido que ser “Raúl Danda”, por mais que me esmerasse, nunca me poderia igualar a vós. E falhei. Mas aprendi de vós, Velho Jonas, que o importante não é não falhar, mas ter a hombridade e a coragem de reconhecer a falha e corrigi-la. Aprendi de Vós que o mais correcto a fazer, quando caímos, é nos pormos de pé, humildemente e sem vergonhas. E é o que tenho feito, todos os dias, em cada gesto, em cada palavra, em cada acto. Hoje, aqui e agora, eu peço o Vosso perdão por qualquer gesto, qualquer palavra, qualquer “qualquer coisa” que eu tenha feito que vos fizesse dizer “até tu, meu filho Brutus?!”.


Perdão Mestre, perdão Alto Comandante, perdão Presidente.


Sei que, do alto da vossa sapiência, compaixão, compreensão e benevolência, esse perdão há muito foi concedido. E é isso quanto me bastará. Se houver algum vivente que queira ter a ousadia de se substituir a vós e agir em sentido contrário, “ngongo yaye” (o problema é dele).


Peço-vos humildemente que me continueis a inspirar, guiar, orientar, ensinar, e abençoar, Vós que, mesmo na morte sois temidos pelos adversários que insistem em ser “inimigos”, quando sempre olhastes para eles como irmãos que pensam de forma diferente.

Presidente Savimbi,
Convosco aprendi a lutar contra a exclusão, a dar o melhor de mim pelo Irmão, a defender a democracia, a servir em vez de me servir, a lutar e nunca desistir. Pois, assim sou e assim serei sempre, porque não não conseguiria ser de outro modo.


Adeus Querido Presidente!


Raúl Manuel Danda, Vice-Presidente da UNITA
Lopitanga, Andulo, Bié, 31 de 05 de Maio de 2019