Luanda - Vive-se sempre uma azáfama quando há detenção, prisão preventiva ou outras e sobretudo quando são postos em liberdade condicional co-cidadãos nossos de "primeira água", foi assim com o Norberto Garcia e pares, Filomeno dos Santos (Zénu), Augusto Tomás, Joaquim Sebastião, José Maria e outros, que “imperaram" durante o regime eduardista, sobretudo pela forma pirotécnica que essas detenções, privações e restituições a liberdade têm sido feitas e tornadas públicas, precedidas sempre de “actos pirotécnicos” do SIC e PGR, apadrinhados pela imprensa, sobretudo a pública e a “reboque”, a privada e as redes sociais.

Fonte: Club-k.net

Entretanto, não está em causa a ordem cronológica como esses “actos pirotécnicos” se têm sucedido ou quem são os seus actores, mas a violação de direitos fundamentais das pessoas visadas nestes processos, pois temos em Angola um sistema jurídico-penal fundado no principio da legalidade, resultando daí a presunção de inocência até transito em julgado da sentença condenatória, e na garantia de um processo criminal justo e dos direitos fundamentais, resumidos na dignidade da pessoa humana.


É consensual que na governação anterior, que teve a testa o Eng.º José Eduardo do Santos (JES) foram cometidas inúmeras "atrocidades e açambarcamento do erário".


Todavia, penso que a adopção de uma justiça selectiva e acompanhada de “atropelos” reiterados dos mais elementares princípios de um Estado Democratico e de Direitos, não configura a melhor opção e o caminho a seguir, ainda que a protesto da prossecução do interesse público, por lesão ao Estado angolano.


Ora, decorridos cerca de dois anos de mandato de JLO e findo o prazo para o repatriamento voluntário de capital, há mais de (8) oito mêses, quase nada se sabe sobre o que efectivamente já foi repatriado voluntariamente e/ou recuperado. Atente-se que o Decreto Presidencial Nº 289/18 de 30 de Novembro, que Estabelece os termos e condições para aplicação dos recursos repatriados, voluntaria e coercivamente, em decorrência da Lei 9/18 de 26 de Junho – Lei de Repatriamento de Recursos Financeiros, estabelece um prazo cumulativo aproximado de (150) cento e cinquenta dias, a contar da data da recepção dos recursos pela instituição financeira bancária, para que se dê inicio ao projecto aplicando o valor recuperado, via investimento pela AIPEX no Âmbito da Lei nº 10/18 de 26 de Junho, do Investimento Privado. Já vão mais de (180) cento e oitenta dias desde o vencimento do prazo para aplicação dos recursos e nada se diz sobre esta “operação”. Pelo contrário o Estado onera-se cada vez mais com esses processos, sobretudo quando há prisões preventivas “luxuosas”.


Entretanto, mais que qualquer detenção e de quem quer que seja não me parece que a selectividade dessas detenções venham a representar ganhos e tão pouco signifiquem a "prossecução" de facto e quiçá de juri do interesse público, senão um carácter mais "populista" e agrado da "mão invisível por trás" dessas detenções… o país não pode ser levado a reboque de “caprichos” de alguns poucos e cair na improdutividade… precisamos começar a pensar já na era pós João Lourenço, pois esses processos, se forem mal geridos, sem dúvidas que transportaremos todo o ônus que daí advém por muitas gerações, a semelhança do status quo que o país se encontra, resultante do longínquo reinado de JES.


Deve referir-se que, a busca efectiva da justiça pressupõe o respeito das normas e formalismos processuais legais. No caso concreto das "publicitadas" detenções e prisões uns vão sendo postos em liberdade condicional, aplicando-se outras medidas de coacção processual menos gravosas em detrimento da prisão preventiva. É sobre essas medidas que prestaremos também a nossa atenção particular.


Assim sendo, convém esclarecer que não se trata de nenhum acto de benevolência quando as medidas de coação pessoal menos gravosas são aplicadas, mas tão somente o respeito ao Estado de Direitos que é ou que se pretende construir em Angola. Infelizmente, por ter havido uma inversão entre a regra, que é a liberdade, e a excepção, que é a privação de liberdade, no que diz respeito a aplicação das medidas de coação pessoal, vemos "todos" com alguma reserva esta situação. A Lei 25/15 - Sobre as Medidas Cautelares em Processo Penal, de 18 de Setembro é clara nos seus artigos 16°, 17°, 18° e 19°, primando pelo princípio da necessidade, adequação e proporcionalidade na determinação de uma das medidas.


Atente-se que a prisão preventiva é uma medida de última rácio e quanto a detenção, aplicada regra geral em casos de flagrante delito, ela é um acto meramente processual para a apresentação do detido junto ao Magistrado do Ministério Público num período não superior a 48 horas para efeito do seu primeiro interrogatório, podendo daí resultar a condução a um processo sumário ou a aplicação de uma das medidas de coação pessoal (art.° 3° e 4° da lei supra citada), entre as quais a prisão domiciliar ou preventiva que são as duas medidas mais gravosas e excepcionais.


Sucede que, nos casos de aplicação dessas medidas, elas obedecem a prazos nos termos dos art.º 40º desta mesma lei, que vai de (4) quatro a (12) doze meses para a instrução preparatória, acusação, pronúncia e condenação do réu em primeira instância, podendo ser acrescido de mais (2) dois meses se o crime for púnivel com pena de prisão superior a (8) oito anos. Daqui percebe-se que não se estará a fazer justiça apenas quando há detenções e prisões preventivas. A inércia por parte dos magistrados do Ministério Público durante a instrução preparatória e dos magistrados judiciais para pronúncia e julgamento, podem levar a extinção da medida de coacção aplicada pelo decurso do prazo legal acima referenciados, nos termos do art.º 24º da Lei 25/15.


Referir que, a prisão preventiva não poderá ser aplicada ou pode ser suspensa por motivos de comprovada doença física ou mental grave, nos casos de mulheres grávidas com mais de (6) seis mêses, as pessoas com mais de (70) setenta anos de idade e sempre que o seu estado de saúde comprovadamente desaconselhe a privação de liberdade e outros que tornem imprescindíveis a presença do arguido em razão de doenças e falecimento de membros do seu agregado familiar, nos termos dos art.º 37º e 41º, ambos da Lei 25/15 - Sobre as Medidas Cautelares em Processo Penal. Por outro lado, tem se verificado o atropelo do art.º 23º desta mesma lei, que confere aos magistrados judiciais (Juízes) a competência de revogação e substituição das medidas de coação (o negrito e sublinhado é propositado). Pois, o modus operandi e faziendi são de per si evidentes por quanto têm sido os magistrados do Ministério Público (Procuradores) a aplicarem, revogarem e substituirem essas medidas.


Atente-se que, depois da vida o bem jurídico maior que qualquer pessoa tem é a sua liberdade ou seja o seu jus abulandi (A sua liberdade de ir e vir)… os nossos “anseios e desejos" não podem sobrepor-se ao direito e as liberdades fundamentais de cada individuo atribuídos pela constituição angolana e acolhidos em convenções internacionais no âmbito da protecção da dignidade da pessoa humana, que não pode em circunstância alguma vir a ser coisificado ou dito de outro modo ser tratado como um mero objecto.


Portanto, a aplicação de uma medida processual de carácter processual menos gravosa, tais como a não detenção do individuo independentemente das circunstâncias que se encontre ou venha a ser encontrado, termo de identidade e residência, a obrigação de apresentação periódica as autoridades e a prestação de caução, não devem ser tidas como algo ex novo ou algo estratosférico, mas tão somente como actos que fazem parte da “órbita” e conformação do nosso sistema jurídico penal, aos ditames de um Estado Democrático e de Direitos que é ou se pretende construir em Angola e que deve ser consolidado particularmente nos casos que em referencia.

N’junjulo J. António.