Luanda - Vim por este meio falar sobre os motivos que levaram alguns reclusos a evadirem-se de algumas cadeias da capital do pais. Estou preso num dos estabelecimentos prisionais de Luanda, e também fui afetado com os acontecimentos que vou contar agora.

Fonte: Club-k.net

Desde o mês de Março do ano de 2018, altura em que o então meritíssimo o Juiz presidente do tribunal provincial de Luanda, João Pedro Kinkani Fuantoni, deixou aquele cargo, que o sistema judicial de Luanda mudou. Foi empossada a meritíssima juíza Maria Guiomar Vieira Dias Gamboa.

 

Desde a tomada de posse da juíza em causa, novas regras foram aplicadas. Desde aquela data que os casos de abuso sexual foram excluídos da lista de delitos que podem ser beneficiados com liberdade condicional.


Quando essa informação nos chegou, achamos que era uma noticia vã, até porque não houve mudança na lei penal. A confirmação não demorou a surgir, dos pedidos de liberdade condicional transitados para o tribunal, todos foram indeferidos. Não importa mais se têm bom comportamento ou se é réu primário, ninguém com caso de abuso sexual sai de liberdade condicional. Outra mudança que houve foi no pagamento da indemnização aos lesados. Antes, assinávamos um termo de compromisso, uma vez em liberdade, tínhamos um prazo para pagar. A juíza Guiomar passou a exigir o pagamento antes da soltura por condicional de 25%. Depois subiu para 50%, agora os reclusos que não pagam 100% a indemnização, não usufruem desse beneficio. Nesse caso entendi-se, pois muitos quando saem, não pagam. Os lesados vão ao tribunal pedir explicação. Mas há aqui pessoas com vontade de progredir, não saem porque a familia não tem dinheiro. Por causa de alguns estamos todos a pagar.


No mês de junho do corrente ano, outra infirmação chegou aos reclusos por meio dos chefes e dos oficiais de justiça dos tribunais. Diziam: penas de 8 anos a baixo, não se beneficiarão de liberdade condicional. E vimos muitos pedidos de liberdade condicional com penas não superior a oito anos a serem indeferidos. As cadeias estão cheias, diariamente, entram entre 50 a 80 reclusos, números superiores à taxa de saída". Estamos nos apertando.


No mês de junho, outra noticia triste chegou: quem se beneficiou de um corte de pena na amnistia de 2016, não terá mais o beneficio de liberdade condicional, e a maioria dos processos que estavam em tribunal foram indeferidos. E continuam sendo indeferido porque, no ver da juíza, não devia haver amnistia ou comutação. Então o governo nos da o perdão, a juíza nos trata assim por causa de algo que o governo nos deu? Então o que é o perdão? Agora só que tem padrinho na cozinha, é que sai de liberdade condicional. Pois até desrespeita a opinião dos seus colegas que muitas vezes nos acompanham desde o principio. Não importa o tempo que cumpriu ou se tem bom comportamento e pagou a indemnização completa aos ofendidos. Nossos pedidos de liberdade condicional têm sido indeferidos arbitrariamente. Sem explicação convincente. Não temos direito a arrependimento, não temos direito a ir cuidar das nossas famílias. Nem todos dentro da cadeia são irrecuperáveis, o que precisamos é uma oportunidade. Cada um aqui tem a sua educação, historia e visão para a vida.


Não podemos sair pra pagar a indemnização fora, não podemos receber o beneficio de liberdade condicional se a pena for de oito anos abaixo, não recebe esse beneficio quem tem o crime de abuso sexual, homicídio, ou todo aquele que foi comutado. Essa ultima noticia abalou os reclusos e fez com que muito evadissem-se das cadeias. É só fazerem um estudo (investigação) e verão que na tentativa de combater a reincidência, a Juíza Guiomar tem sido coerciva de mais com aqueles que muito querem sair para terminar sua formação e trabalhar para recuperar o tempo perdido. Só crimes Hidiondos não merecem liberdade condicional: Genocídio, Homicídio qualificado, e coisas do gênero. Mas a juíza Guiomar cortou esse beneficio a muitos, do nada e sem explicação. Nós, passamos numa comissão de avaliação, e o pedido de liberdade condicional não transita se o recluso não for considerado apto. Porque faz parte da comissão de avaliação, todos chefes de repartição, chefiados pelo director do estabelecimento. Juíza Guiomar não respeita as opniões daqueles fazem o acompanhamento, os que dão informação a nosso respeito sobre o nosso comportamento. Só quando estamos no tempo que já vem designado no processo liquidação de pena. Não gozamos dos nossos benefícios como ir pra casa passar de semana com a familia.


Todas cadeias de Luanda, juntas guardão mais de oito mil reclusos. Mas desses, menos de 20 têm licença pra ir pra casa de passe extra penal.


A justiça Angolana está declinando. Os casos só se resolvem nas televisões, é isso que a minha familia e de outros reclusos farão brevemente. Se expor e nos expor, para ver o nosso problema resolvido.


Na tentativa de conter o alto nível de reincidência, a Juíza Guiomar está tratando mal todos os reclusos. Nem todos nós qualificamos um crime. Num lapso, sem planificar, muitos acabaram por cometer. Tudo o que queremos é uma oportunidade de refazer a nossas vidas.


Não podemos pagar por aqueles que entram é saem da cadeia toda hora. Dizer também que o mal acompanhamento, principalmente dos que saem de liberdade condicional é um dos factores que os levam a voltar ao crime. Quando saem, devem ir ao tribunal sempre, no prazo estabelecido, assinar presença. Muitos não vão, o tribunal não os manda capturar, nem chamam o familiar que assumiu a responsabilidade pela soltura por condicional do reú. A população reclama da reincidência, dizer que a maioria dos reincidentes nunca foram responsabilizados como deve ser. Cometem, são presos, o procurador fica com o processo guardado até a poeira baixar, pede dinheiro na familia e logo põe o criminoso de volta a sociedade. Um crime que se fosse a julgamento, talvez seria condenado 20 anos, ele cumpre 1 ano ou 2, e é solto. Como resultado, volta a cometer. A população pensa que todo mundo entra, sai para cometer novamente.


É desumano o que estamos a passar. Não a condições, todas as cadeias de Luanda, não a colchões, lençóis e medicamentos nos postos medicos. A única que tem doutores e especialista de saude, é a comarca de viana. A inspeção vem, entram, tiram fotos pra dizer que estiveram no terreno, vão almoçar na casa do director enquanto os carros estão sendo abastecidos com alimentos na logística e saem felizes com alguns trocados. A justiça está a ser mal ministrada. Aqui em Luanda os reclusos só ficam na maxima segurança, não a mudança de regime, passamos o tempo todo trancados, como é que não saem raivosos? O que esperam de alguém que foi condenado 12 e cumpriu os dose anos sem sequer fazer algum trabalho remoneratorio ? Vai sair sem sequer ter onde dormir, sem poder comprar um colchão, algumas roupas e alugar um quarto ou tratar documentos. Esse cara não voltará como pra cadeia? As pulseiras eletrônicas já deviam estar a funcionar, para dar mais dignidade a pessoas que não comeram crimes graves e dar oportunidade de liberdade condicional sob acompanhamento a aqueles que a muito tempo estão pagando por seus crimes. Também somos parte da população. As cadeias estão super lotadas. Com as pulseiras vamos evitar que coisas simples levem cidadãos as celas imundas das nossas cadeia. Com o novo código penal, que venham melhorias também. Condenar sem dar oportunidade é desumano. Juíza Guiomar, mais humanismo.

Réu primário tem atenuantes, não seja coerciva de mais, porque muitos ainda têm idade pra estudar e terminar a formação, contam com a saída de liberdade condicional. Acompanhem melhor os reclusos. Tenho certeza que a meritíssima Guiomar nunca visitou um estabelecimento prisional, para ver o que passamos.

Estamos numa sociedade que paga muitas vezes mais para quem julga, do que para quem educa, terá sempre grandes problemas para formar grandes lideres. Pois nenhuma dor devia ser pensada sem que criem pontes de alivio. Nenhuma falha deveria ser corrigida e recuperada sem gerar um aprendizado