Luanda - Todos os generais do Estado-maior das Forças Armadas Angolanas faziam parte dos projectos mineiro nas Lundas. Estou a referir-me a Kopelipa, João de Matos, Geraldo Sachipengo Nunda, João Lourenço, Dino Matross e tantos outros, disse recentemente ao Jornal “Hora H”, José Zeca Mutchima, Presidente do Movimento Protectorado da Lunda Norte.


*Ana Mendes (entrevista de Abril 2019)
Fonte: Jornal H

Segundo o activista, o ex-Presidente José Eduardo dos Santos é que havia agrupado entre cinco a nove generais a quem atribuiu licenças para a exploração de diamantes. Mesmo dentro do próprio MPLA houve dirigentes que se beneficiaram desse processo.


Jornal “Hora H”; A quem se refere quando fala dos dirigentes do MPLA?


José Zeca Mutchima: Estou a falar do João Lourenço, José Eduardo dos Santos, Dino Matross e muitos outros do Bureau político do MPLA, e eles não podem se dar de inocentes.


JHH; Mas as licenças não eram passadas pelo ex-Presidente José Eduardo, como é que funcionava?


JZM; As licenças eram passadas pelo Ministério de Geologia e Minas, mas tinha a mão de José Eduardo dos Santos. E vou-lhe dizer o seguinte, nas negociações com a UNITA ouvimos que ao referido partido lhe fora cedida uma parcela para explorarem diamantes, mas numa conferencia que participei com o líder da bancada parlamentar da UNITA, Adalberto da Costa Júnior, disse que o seu partido nunca explorou nenhuma mina. E hoje temos aí as minas de Xitotolo, Kwango e o Lulu e nos perguntamos se as mesmas pertencem a quem.

 


JHH; Quantos projectos de exploração existem nas Lundas?


JZM; Desde o princípio até 06 de Setembro de 2018 (dois mil e dezoito), havia mais de duzentos projectos de exploração de diamantes em toda Lunda, uns registados e outros não, na ENDIAMA e no Ministério de Geologia e Mina. Portanto eles ocupavam todos riachos daquela parcela do território.

 

JHH; Quantos estrangeiros ilegais se encontravam nas Lundas?

JZM: Aproximadamente as Lundas tinha mais de oitocentos mil cidadãos estrangeiros a procura de diamantes, e estes elementos contribuíram muito para a degradação do ambiente, porque todos os rios foram transformados para a exploração de diamantes durante muitos anos.


JHH; De que empresas se refere?


JZM: Temos o projecto Xitotolo, pertence a quem? O Lulu e tantas outras; há um tempo que era proibido dizer que no mês X produzimos X milhões de quilates de diamantes para não despertar as populações sobre a riqueza que estes senhores foram explorando durante muitos anos. E até seis de Setembro de dois mil e dezoito mais de duzentos mil projectos mineiros em toda Lunda, registados ou não no Ministério da Geologia e Minas e na ENDIAMA.


JHH; A exploração de diamantes não provocou a poluição do meio ambiente?


JZM: Claro que provocou. Porque todos os rios e riachos foram explorados para procurarem diamantes para estes dirigentes, e eles não estão a pensar se daqui a cinquenta ou quinhentos anos as novas gerações vão sofrer problemas graves com o que está a ser feito por estes senhores. Eu não conheço um cidadão natural das Luandas a quem pertence uma empresa de exploração de diamantes, conforme domino as figuras do aparelho do Estado que saqueiam a terra para benefício pessoal.

 

JHH; Está a querer dizer que os naturais não praticam o garimpo?


JZM: Agora é que a ENDIAMA está a tentar legalizar alguns elementos para praticarem a exploração do garimpo artesanal, como o rei Mwatchissengue faz, porque quando veio a Luanda era para pedir favores a Endiama que lhe atribuíssem licença de exploração de diamantes artesanalmente. Por isso é que disse que não dominava a existência do Movimento Protectorado. Portanto a instituição que tem o poder para legalizar as licenças de exploração só as dá para os sobas quando sabe que as áreas que pretendem explorar não há maior probabilidade de encontrar diamantes de maior dimensão.


JHH; Quem são os compradores dos diamantes artesanais que o população explora?


JZM: A ENDIAMA, é que compra as pedras que os pacatos cidadãos conseguem. E estão todos identificados os elementos da Empresa Nacional de Diamantes de Angola que têm estado a fazer a ponte para a compra das pedras preciosas. E para salientar, o general Higino Carneiro, Ganga Júnior, Carlos Sumbula, os filhos de José Eduardo dos Santos, estão envolvidos nos negócios dos diamantes, por isso é que estou a dizer que toda elite angolana está pendurada nesta máfia de dos diamantes, isso não é difamação é verdade absoluta e não é segredo para ninguém.


JHH; A riqueza que o Estado explora nas Lundas, o povo sente o retorno?


JZM: Nas Lundas não temos nada de investimentos que orgulha os nativos. Dos mais de quarenta e três anos de independência nunca houve a construção de grandes obras de raiz, é apenas uma ou outra escola que os padres têm estado a construir e o governo também seguem o mesmo exemplo erguendo escolas com três há seis salas de aulas para o ensino primário e o primeiro ciclo. A região das Lundas anda abandonada, por isso é que temos lutado bastante para que o governo do MPLA nos dê a autonomia para desenvolvermos aquela região.

 

JHH; Senhor presidente, os diamantes rendem muito dinheiro?

JZM: Claro que rende. Eu ando a comparar o petróleo bruto com os diamantes, e vejamos um Kará de diamante pode custar dois mil dólares e um barril de petróleo custa menos de cem dólares. Portanto as pessoas estão identificadas e as mesmas também são assessores do Presidente da República João Lourenço, e são eles que travam todas tentativas que temos estado a fazer para nos darem a autonomia, com medo de perder os seus investimentos no ramo dos diamantes que exploram nas Lundas.

 

JHH; O senhor conhece nomes de empresas de alguns dirigentes que citou acima?

JZM: Por exemplo, Carlos Sumbula no Kuango com a operação transparência levou muitos elementos que vendiam diamantes e eram sustentados por ele. O Xitotolo é praticamente da Isabel dos Santos e seus irmãos, o Lulú, portanto seriam eles a assumirem isso publicamente. E para reforçar, havia um cidadão estrangeiro chamado Gaoson, no Lukapa, que comprava diamantes defronte da Unidade da Polícia Nacional. Nunca foi detido e era intocável porque oferecia viaturas. E depois do dia sete em que foi lançada a operação transparência as águas ficaram turvas.


JHH; Uma vez que o senhor tem estado a lutar pela independência nas Lundas, não teme que um dia o governo pode lhe acusar de crime contra a segurança do Estado ou traição à pátria?


JZM: Quando começamos com o activismo fomos acusados de crime contra a segurança do Estado e muita gente foi presa, ficaram muitos anos na cadeia e depois alteraram a constituição e fomos libertos. Portanto Angola anda dividida, e nós podemos lutar e pedir a nossa independência. E se amanhã meterem-me na cadeia, há vários Zecas Muxima que estão aí e eles já não querem conversa, mas sim a guerra, portanto nós é que temos estado a travar isso. Tentem pôr Zeca Muxima na cadeia vão ver qual será a reacção da comunidade internacional.


JHH; O senhor tem apoio da comunidade internacional?


JZM: Não digo muito, mas temos apoio internacional, por isso é que digo que há várias representações em vários países do mundo. E quando se fala da Lunda, os estrangeiros pensam que já estamos independentes e questionam-nos se João Lourenço é presidente da Lunda. E gostaria de desafiar o governo MPLA a me apontar o dedo que estou a dividir Angola ou a me incriminar que estou a cometer um crime contra a segurança do Estado vão ver que não é possível e tenho certeza que não terão forças para o fazer.


JHH; Que balanço faz dos governos das Lundas?

JZM: Qualquer governador que está naquele território é simples trabalhador do MPLA, porque não tem orçamento e têm dificuldades de implementar os projectos e eu tenho pena deles. Todos os projectos saem de Luanda para serem executados lá, e ele fica apenas a fazer propaganda nas rádios e o povo pensa que ele é que está a estragar a província enquanto que não. E gostaria de desafiar João Lourenço para me mostrar um projecto que está a ser feito nas Lundas que custou cinquenta milhões de dólares em benefício daquele povo.


JHH: Os orçamentos da província não satisfazem as necessidades da população?

JZM: No orçamento passado contabilizou-se para cerca de quatrocentos milhões de dólares para as quatro províncias do leste do país, e dividindo este valor por trinta e três municípios que aquele território tem este dinheiro só caberia para trinta dias. Como é possível que quatro províncias nunca tiveram um orçamento que chega aos dois bilhões de dólares, uma vez que elas é que produzem muita riqueza para este país, portanto nenhum governador está em condições de dizer que vai resolver os problemas que aquela população vive. Aí, está a necessidade das Lundas serem autónomas para terem o seu orçamento e procurar resolver os seus problemas internamente e deixar de depender do governo de Angola.


JHH; Alguma vez o senhor dedicou-se a exploração de diamantes artesanalmente?

JZM: Felizmente nunca estive envolvido nisso, e vivi muito tempo fora de Angola. O garimpo artesanal não garante a segurança social do individuo, e a maioria da população que encontra o garimpo como meio de sobrevivência muitas vezes ficam um ano ou mais na mata sem encontrar sequer um diamante e outros acabam por morrer lá de doença ou mesmo assassinados pelas forças do governo.


JHH; Acha que os portugueses tinham que apoiar Cabinda e as Lundas para se tornarem independentes?

JZM: Os portugueses são falsos, porque seriam eles a nos ajudarem para dirimirmos esta violação que o governo angolano tem protagonizado com as populações de cabindas e Lundas que vem a lutar há muito tempo. Porque é que eles quando se deslocam a Angola não visitam estes dois territórios e limitam-se apenas em Lunda, Benguela e Huila? Portanto estes senhores não merecem o nosso respeito.

 


JHH; Uma vez que as autarquias se aproximam, e o governo não tem dado luz verde ao Movimento do Protectorado. O senhor vai concorrer em 2020?


JZM: A Lunda é um país. Eu não vou me candidatar para trair o meu povo, porque até já entreguei uma constituição ao governo Angolano e a comunidade internacional. Portanto as autarquias é um jogo político dos partidos políticos da oposição chegarem ao poder, e com que meios estes autarcas vão desenvolver os municípios se nós sabemos que a maioria dos municípios não têm água potável, energia eléctrica, estradas todas degradas e não produzem praticamente nada, onde é que irão buscar receitas para movimentar as comunidades.


JHH; O senhor fala sempre de corrupção, será que alguma vez já foi corrompido?


JZM: Eu sou muito coerente e sou uma pessoa formada. E quando fui para a luta da independência das Lundas fui de cabeça erguida e não por aventura ou para querer ter carro bonito e dinheiro. Tem havido várias tentativas de corrupção, mandam pessoas para me convencer a abandonar a causa e eu não posso fazer isso por honra a minha família porque sou de uma família de Mwana Ngana.


JHH; Dadas as violações dos direitos humanos que vem sofrendo, já contactou o governo central?


JZM: No regime de José Eduardo dos Santos escrevemos mais de cinquenta cartas, com João Lourenço já estamos com mais de dez cartas, portanto o silêncio é total por parte do governo angolano.

JHH; O Presidente João Lourenço disse recentemente que em Angola não há perseguição nem fome. Isso é verdade?

JZM: Acho que ele não vive em Angola, mas tem toda razão porque sempre teve uma vida de luxo durante os quarenta e três anos que o MPLA está no poder. E sabemos que na governação de José Eduardo, foi governador de Benguela, Moxico, ministro da Defesa, Secretário-geral do MPLA e vice-presidente da Assembleia Nacional, portanto ele pertence a elite angolana e não conhece Angola por isso é que fez tais declarações. E uma vergonha quando um presidente não admite a realidade do seu povo, e quando diz que em Angola não há fome, as mortes de pessoas e gado que acontece no Cunene não são vidas? Os vinte e um activistas presos nas Lundas, em Cabinda não é perseguição.


JHH; Qual tem sido fonte de sobrevivência da população das Lundas?

JZM: A pobreza e extrema no seio da população, e muitos prostituem-se para se alimentar. Hoje nas Lundas, a prostituição infantil multiplicou por causa da ordem económica, e o presidente João Lourenço quando visitou a Lunda passou num bairro para falar com o povo, que ele hoje diz que não há fome. As mortes nos hospitais multiplicam-se dia pois dia por falta de medicamentos e de meios técnicos para o funcionamento das instituições sanitária.

 

JHH; Qual é o principal objectivo do Movimento do Protectorado?


JZM: O objectivo do Movimento do Protectorado é conhecido pelo governo angolano, e já entregamos a José Eduardo dos Santos e a João Lourenço. Nós redigimos uma constituição, que permite-nos governar e fazermos da Lunda um país bom para viver, como a Escócia e o MPLA é que tem medo de perder o poder que exercem na exploração de diamantes nas Lundas.

 

JHH; Que mensagem deixa ao povo das Lundas e ao governo angolano?


JZM: Primeiro ao governo Angolano, não tenham medo de negociar a autonomia da Lunda, e aqueles que têm minas de diamantes nós não vamos retirá-los dos locais em que estão a explorar, mas sim actualizar a lei para que as riquezas beneficiem a população. E ao povo das Lundas, ajudem o movimento a crescer e o ministro do Interior, Ângelo da Veiga Tavares, o Procurador-Geral da República para pararem com as detenções nas Lundas e soltarem os activistas que se encontram presos naquele território.