Luanda - José Filomeno dos Santos "Zenu", implicado no processo de desvio de USD 500 milhões, afirmou hoje (quarta-feira), em tribunal, que só está a ser julgado por "ser filho do ex-Presidente da República, José Eduardo dos Santos".

Fonte: Angop

Zenu dos Santos foi ouvido durante o terceiro dia do julgamento em curso na Câmara Criminal, numa sessão que voltou a ficar marcada pela ausência do co-réu Valter Filipe, internado numa clínica no bairro Benfica.

 

O antigo presidente do Conselho de Administração do Fundo Soberano confirmou a recepção, do proprietário da empresa Mais Financial Service e co-réu Jorge Gaudens, de uma carta entregue ao ex-Presidente da República.

 

A missiva, vinda do banco BNP Periban, fazia alusão a um pretenso financiamento, a favor de Angola, de Euro 30 mil milhões, culminando com uma transferência de USD 500 milhões, que serviria de fundo de garantia do aludido empréstimo.

 

O juiz entendeu a tramitação desta carta como uma “quebra de protocolo”, questionando-o se intermediou o encaminhamento do documento ao então Presidente da República por ser seu pai, uma vez que podia ter aconselhado o seu amigo a seguir os canais diplomáticos e protocolares.

 

“Só estou a ser julgado por ser filho do ex-Presidente da República", respondeu o arguido.

 

Explicou que o seu papel nesse processo foi, sempre, o de emitir sugestões, mercê da experiência de cinco anos que acumulava na gestão do Fundo Soberano de Angola.

 

“Tanto o BNA como o Fundo Soberano gerem activos avultados. E foi nessa condição que participei à convite, às vezes por escrito, às vezes de forma verbal, de membros do governo e da Presidência da República”, sustentou.

 

Prova disso, apresentou em tribunal e pediu para incluir nos autos, fotografias e convocatórias que recebeu da Presidência da República para participar de uma reunião entre o ex-Chefe de Estado, o representante da Mais Financial Service, Jorge Gaudens, e o interlocutor do sindicato dos bancos, Hugo Wonda Weter.

 

Citou também, como partícipes da aludida reunião de Junho de 2017, na Presidência da República, o ministro de Estado da Coordenação Económica e Social, Manuel Nunes Júnior, das Finanças, Archer Mangueira, o governador do BNA, Valter Filipe, e o então assessor do PR para os Assuntos Económicos, cujo nome disse desconhecer.

 

Durante o seu depoimento, nesta fase de produção da prova material, Zenu dos Santos mostrou-se “desalinhado” com as declarações do seu amigo de há 30 anos, Jorge Gaudens, no quesito sobre como se apresentava a carta enviada ao Titular do Poder Executivo.

 

Ao ser questionado sobre como soube do conteúdo da carta, informou que a mesma veio num envelope aberto, enquanto, na sessão anterior, Jorge Gaudens, o suposto articulador de toda operação, tinha afirmado que a carta estava num envelope lacrado.

 

Interrogado sobre as razões que levaram o ex-ministro das Finanças, então representante do governo nas negociações do processo, a ser substituído pelo governador do BNA, Valter Filipe, disse desconhecer porque “não questiono ordens superiores do Titular do Poder Executivo”.

 

Confirmou igualmente que integrou a delegação do governo angolano, liderada pelo ex-governador do BNA, Valter Filipe, que se deslocou a Londres (Inglaterra) para assistir a assinatura do acordo de transferência dos USD 500 milhões.

 

Disse que esse dinheiro serviria de garantia para o sindicato de bancos financiar projectos socioeconómico, disponibilizar mais divisas ao país, refinanciar a dívida pública e criação das parcerias público-privadas, no valor de Euros 30 mil milhões.

 

Além de Valter Filipe e de Zenu dos Santos estão implicados no caso o ex-director do Departamento de Gestão de Reservas do BNA, António Samalia Bule, e o empresário Jorge Gaudens.

 

Os quatro réus respondem por uma alegada transferência ilegal de USD 500 milhões do Banco Nacional de Angola (BNA) para uma conta no Crédit Suisse de Londres, Inglaterra.

 

No processo, Valter Filipe vem acusado dos crimes de peculato, branqueamento de capitais e burla por defraudação.

 

Zenu dos Santos e os outros dois vêm acusados dos crimes de tráfico de influência, branqueamento de capitais e burla por defraudação.

 

O júri terminou a sessão desse terceiro dia marcando para quinta-feira a audição do terceiro réu, no caso António Samalia Bule Manuel.