Washington  - Um tribunal nova-iorquino, do distrito federal do Sul, marcou para 30 de Outubro deste ano o início do julgamento do processo que ficou conhecido em Angola como o “Caso Aenergy”. A acção, de natureza cível, foi intentada pelas empresas Aenergy e Combined Cycle Power Plant Soyo, S.A e constam da lista de réus o Ministério da Energia e Águas (MINEA), a Empresa Pública de Produção de Electricidade (ENDE), a Empresa Nacional de Distribuição de Eletricidade (PRODEL), assim como a General Electric Company (GE), a GE Capital e, por último, o Ministério das Finanças (MINFIN).

Fonte: Club-k.net

A notificação daquele tribunal federal, tornada pública esta semana (VER: aqui), indica como data de realização da primeira audiência o dia 30 de Outubro de 2020, o juiz da causa (Alison J. Nathan), e o horário em que a sessão terá lugar (às 15h45, hora local no estado de Nova Iorque).



A Aenergy e a Combined Cycle Power Plant Soyo exigem ao Tribunal Nova-Iorquino a condenação de todos os réus e falam numa compensação, “por danos e perdidos por si sofridos, não inferior a 550 milhões de dólares americanos”, e justificam a acção de responsabilidade com “as condutas impróprias, ilícitas e criminais” dos arguidos do processo.


Em causa está uma reclamação apresentada àquele tribunal federal pela Aenergy, que acusa o Governo angolano de lhe ter expropriado, de forma ilegal, bens da sua propriedade, após decisão de rescindir os 13 contratos que a ligavam ao Ministério da Energia e Águas, e o consequente arresto de quatro turbinas, consumíveis e peças.


O Governo angolano acusou, no ano passado, a Aenergy de ter cometido “irregularidades” na aquisição de turbinas, o que na opinião do Executivo constituía uma “violação do princípio da boa-fé” e de ter “quebrado a confiança da relação contratual” entre as partes envolvidas. Em resposta, a Aenergy recorreu da decisão, exigindo a a sua revogação.



O processo, que deu entrada no tribunal nova-iorquino, no dia 7 de Maio de 2020, seguiu-se a uma acção anterior junto da Justiça americana. Em Novembro de 2019, a Aenergy requereu um pedido de assistência judicial junto do Tribunal de Nova Iorque, que ordenou a General Electric a entregar à Aenergy todos os documentos em sua posse relacionados com a resolução dos “Contratos entre a Aenergy e o MINEA” e com a aquisição das turbinas pela Aenergy à General Electric.

Em causa está a rescisão unilateral de 13 contratos celebrados entre a empresa Aenergy e o MINEA, a cessação do contrato de concessão com a sua subsidiária Combined Cycle Power Plant Soyo, S.A e o polémico arresto de quatro turbinas, como consequência de uma providência cautelar intentada pelo Estado angolano contra a Aenergy, por alegados “indícios de violação de contratos”.

A Aenergy reclama agora junto do tribunal federal de Nova Iorque da “resolução unilateral dos contratos comerciais celebrados com o MINEA”, apontando a General Electric como “cúmplice”, e a quem acusa mesmo de “ter falsificado e utilizado documentos forjados por seus funcionários e proferido afirmações falsas e enganadoras sobre a relação comercial então existente entre a Aenergy, GE e MINEA”.

Antes da acção agora intentada a 7 de Maio de 2020, a Aenergy já tinha requerido, em Novembro de 2019, um pedido de assistência judicial junto do Tribunal de Nova Iorque, tendo aquele tribunal ordenado à General Electric a entrega à Aenergy de todos os documentos em sua posse relacionados com a resolução dos “Contratos entre a Aenergy e o MINEA” e a aquisição das turbinas pela Aenergy à General Electric.

Em Janeiro deste ano, de acordo com informações a que tivemos acesso, a Aenergy fez chegar à justiça angolana e à PGR várias dezenas de documentos provenientes da General Electric, incluindo mails e relatórios internos, envolvendo actuais e antigos quadros superiores da empresa americana.

Um conjunto de informações sobre o caso que neste momento estão acessíveis para consulta pública demonstram o envolvimento da GE na falsificação de documentos, encobrimento e tentativa de incriminação da Aenergy.

Após o Tribunal de Nova Iorque ter ordenado a entrega de toda a informação em sua posse, no âmbito do processo de assistência judicial, a GE teria entregue à Aenergy, de maneira inadvertida, um conjunto de documentos importantes que, a posterior, tentou recuperar, invocando o “princípio da confidencialidade dos mesmos” junto das instâncias judiciais nova-iorquinas, de modo a impedir a sua divulgação e utilização no processo da Aenergy.

Numa outra decisão tomada a 3 de Abril de 2020 (VER: https://www.courtlistener.com/recap/gov.uscourts.nysd.527167/gov.uscourts.nysd.527167.61.0.pdf), o Tribunal de Nova Iorque negou à GE o direito à confidencialidade desses documentos e aceitou que a Aenergy pudesse utilizar os mesmos, no âmbito dos processos judiciais em curso, tendo deixado um sério aviso à actuação da General Electric:

“A invocação da confidencialidade por parte da GE relativamente aos três documentos que a GE pretendeu recuperar expuseram o verdadeiro, embora dissimulado, propósito estratégico por detrás das suas tácticas processuais. A GE deverá considerar-se advertida de que o Tribunal não aprova a implementação destas suas tácticas. Se a GE optar por persistir nestas tácticas, o Tribunal reserva-se no direito de implementar todas as providências e sanções em Direito permitidas contra a GE”.

Entre os documentos que a GE quis retirar do processo estava um mail interno de 12 de Outubro de 2017, enviado pelo CEO da GE Angola para a GE Capital com cartas falsificadas da PRODEL e da ENDE, onde o referido alto quadro da GE afirmava ter obtido aquelas cartas e recolhido a respectiva assinatura directamente da PRODEL, E.P. e da ENDE, E.P.



A GE pretendeu também retirar do processo um mail do advogado interno da GE Capital, de 28 de Janeiro de 2018, onde este aconselhou a GE a omitir perante o MINEA o conteúdo do referido mail do CEO da GE Angola, numa aparente tentativa de encobrimento.

A Aenergy acusa também o MINEA de ignorar os seus esclarecimentos e solicitações, incumprindo de forma grosseira a lei angolana, ao não ter notificado, nos prazos legais, o procurador-geral da República de que “havia indícios da prática de um crime, envolvendo a falsificação e uso de documentos falsos supostamente emitidos por entidades públicas sob a supervisão do MINEA”.

Pode-se ainda ler na acusação que a AE acusa o MINEA de “aceitar acriticamente a versão dos acontecimentos do então CEO da GE Angola, protegendo os interesses pessoais deste e da própria General Electric, recusando-se a promover qualquer investigação independente dos factos”. Segundo a acusação, o MINEA concertou com a GE, em privado, para ficar com turbinas adicionais sem pagar o seu preço e a transferir todos os contratos entre a Aenergy e o MINEA para a GE.