Luanda - 2020 foi o ano em que as famílias angolanas "desconseguiram" de comprar, sem vergonha nem mangonha, um simples saco de arroz ou uma caixa de "conchas" de frango.

Fonte: Club-k.net

A kixikila evoluiu para a SÓCIA, uma modalidade que permitiu salvar o poder aquisitivo da maioria das famílias. Nem o próprio governo intocável (o chefe não vai gostar), nem as suas falanges de apoio, incluindo a toda poderosa OMA, perceberam que a fome mata e que a propaganda só alimenta a quem já tem a barriga cheia.

 

A SÓCIA é o expediente mais notável concebido pelas mães, irmãs, esposas e filhas de toda Angola para que o pão nosso de cada dia não faltasse à mesa, pelo menos uma vez por dia, seja de manhã, à tarde ou à noite. Quem sabe de madrugada.

 

A SÓCIA não tem sindicato, não pertence aos grupos empresariais com livre trânsito para o palácio, nunca foi ouvida no parlamento porque não faz parte da estupidificada concertação social e nem tem ilusões de ser incluída nos conselhos consultivos de esterilidade reiterada.

 

Quem alimenta os filhos de Angola é uma mulher chamada SÓCIA, que se multiplica de Cabinda ao Cunene por milhares de mamãs para repartir todas as responsabilidades em defesa do bem maior. A vida. Desengane-se quem esteja a pensar que os noticiários mostram toda a verdade sobre o dia a dia dos descendentes de Nzinga Mbandi, Kimpa Vita, Ekuiki II, Mutu Ya Kavela, Mandume e Ngola Kiluange.

 

Os filhos do PRODESI, PIIM, PREI, PAPE, PAC e companhia limitada já têm pai grande que fala alto. Mas falta-lhes o ventre maternal para que possam ganhar uma vida fecunda. Isso não é política. É a essência da humanidade.

 

A miséria não precisa de culpados. Precisa apenas de um compromisso nacional para uma solução concertada, desprovida dos tradicionais heróis de circunstância que passam a vida a publicitar os esforços do executivo, sem terem noção dos sacrifícios consentidos pelos cidadãos que votaram de boa fé nesse mesmo executivo. E os que não votaram não são menos cidadãos.

 

Quase todos os anos realizam-se inquéritos para divulgar factos e números dourados sobre as mais diversas realidades, muitas das quais ninguém entende. Mas não há coragem para apurar os níveis de desnutrição das nossas crianças, o sacrifício das nossas gestantes, a poluição das nossas vilas e cidades, a intensa maldade dos nossos eleitos que aprovam bônus de Natal para se empanturrarem descaradamente em tempo de crise.

 

Se as pessoas que mandam na nossa terra prestassem alguma atenção à SÓCIA, iriam perceber que a boa governação só é possível com pessoas humanas. Esta é a condição indispensável para que os governantes tenham um fio condutor no sentido de não terem medo da honestidade, sendo livres para se comprometerem em aplicar da melhor forma, sem roubar de forma alguma, os parcos recursos que são de todos os filhos e enteados da bela pátria angolana.

 

O ano novo é sempre momento de reflexão. Em todo o mundo. Em todas as famílias. Por esta razão, nunca é tarde para tentar decifrar os caminhos atribulados das mulheres do nosso tempo que pagam com muito sacrifício a renda de casa, as propinas do colégio e a faculdade dos filhos, o calor e o amor do companheiro frustrado, a honra da família e o compromisso da SÓCIA, para não faltar às compras do mês que vem.

 

Feliz Ano Novo, meus amores para todo o sempre.