Prevenção made in China

Grupos imensos de chineses esperam a sua vez de terem os passaportes carimbados. A oficial da imigração reclama para quem quiser ouvir: “Esses chineses vêm a Angola e não conseguem entender o que é perguntado.”

Os recém-chegados não entendem uma palavra.

A multidão que desembarca diariamente em Angola tem uma explicação: a China é hoje um dos principais financiadores da reconstrução do país, devastado depois de quase três décadas de guerra civil, que só chegou ao fim em 2002.

Em troca de empréstimos e apoio massivos – estima-se que sejam mais de US$ 4 bilhões desde 2004 –, a China garantiu uma fatia generosa da futura produção de petróleo de Angola, hoje o segundo principal produtor na África, atrás da Nigéria.

O acordo também determina que 70 por cento dos projectos de reconstrução devem ser dados a empresas chinesas, que preferem trazer os seus próprios trabalhadores.

Segundo dados da Embaixada da China em Angola, hoje são 20 mil chineses trabalhando em todo o país, embora alguns relatórios estimem essa população entre 40 e 100 mil.

Com esposa e filho na China, He Fei, 35 anos, reúne todas as características da força de trabalho chinesa em Angola: homem, jovem, casado e em busca de melhores oportunidades no além-mar.

“Vim para Luanda, porque não tinha dinheiro. Aqui as coisas são melhores”, diz He, que trabalha na obra de um prédio de sete andares na área da Maianga.

Porém, uma série de factores pode inviabilizar o sonho de uma vida melhor: a mobilidade, a distância da família, o dinheiro que sobra no final do mês e a falta de campanhas de prevenção tornam esses imigrantes um alvo fácil para o HIV.

Apostando no isolamento

A paisagem em Luanda é salpicada por um sem-fim de construções. Nelas, um denominador comum: trabalhadores chineses, em seus inconfundíveis uniformes azuis, que parecem não se importar com o calor escaldante de Novembro.

O trajecto entre a construção e os alojamentos é feito de ónibus. Em muitas obras, o trabalho continua à noite e nos finais de semana. A maioria prefere passar os tempos livres nos complexos onde mora. O contacto com a população local é mínimo.

“Eles preferem não sair. Muitos já tiveram experiências ruins, já foram assaltados ou parados pela polícia, porque os documentos ainda não estavam regularizados”, explica Wang Wei, conselheiro da embaixada da China em Angola.

É nesse isolamento que as empresas apostam quando se trata de prevenção do HIV.

Angola tem uma seroprevalência nacional de 2,5 por cento - em certas zonas fronteiriças chega a 10 por cento –, mas os números não parecem assustar: as campanhas de prevenção do HIV e SIDA são praticamente inexistentes.

“Nós só damos um aviso aos recém-chegados: não saiam e não encostem nas moças locais”, brinca Yan Xing Hua, gerente do escritório de engenharia da empresa estatal chinesa Sino-Hydro.
 
"Não saiam e não encostem nas moças locais"
Em Angola desde 2005, a empresa tem cerca de mil trabalhadores em todo o país, empregados na construção de prédios, escolas, hospitais, estádios, ferrovias, estradas e represas.

Segundo Yan, o único tipo de informação que eles recebem antes de sair da China é uma brochura com avisos sobre os potenciais perigos para a saúde, que inclui a SIDA.

Fonte: Plusnews