Kuito -  A Presidente da Liga da Mulher Angolana (LIMA), Miraldina Olga Marcos Jamba defendeu, em entrevista ao Club-k, que as militantes da OMA deviam trabalhar, realmente, no sentido de salvaguardar a paz e a reconciliação nacional e não enveredarem pela intolerância política.

 

*Lucas Pedro
Fonte: Club-k.net

“Elas são instrumentalizadas”, garantiu a líder da segunda maior organização feminina do país, aquando das comemorações do seu 39º aniversário, a partir da província do Bié, apesar de concordar que ambas as organizações (a LIMA e a OMA), em alguns casos, partilham ideias comuns, sobretudo nas questões que zelam pela defesa dos direitos das mulheres angolanas.

 

Por outro lado, diz, sem papas na língua, que se considera como uma activista dos direitos da mulher angolana, acrescentando que “a nível do nosso partido, UNITA, a mulher alcançou realmente posições bastante significativas”.

 
Club-k - Que balanço faz dos 39 anos da fundação da LIMA?

Miraldina Jamba - Hoje estamos a comemorar os 39 anos da sua fundação. Para uma organização 39 anos é já um percurso bastante significativo. Pois, nós sabemos que a LIMA foi fundada numa altura em que ainda se desenrolava o conflito armado contra o colonialismo português. Portanto, as mulheres participaram activamente na luta de libertação nacional e a LIMA tem um mérito de ter estado lado-a-lado com os homens neste grande empreendimento que, foi a derrocada do colonialismo português e a conquista da independência de Angola.

Portanto, nós louvamos esta participação e temos heroínas que se destacaram nessa época. Quando hoje celebramos os 39 anos, nós queremos dizer que valeu bem a pena, pois a LIMA é um instrumento por excelência da UNITA que fala em nome das mulheres que não têm voz.

 

Club-k - A senhora não acha que é cedo cantar  vitória, uma vez que a mulher angolana ainda não conseguiu alcançar o seu espaço na sociedade...

MJ - Nós sabemos que no nosso país ainda há muitos desequilíbrios. Há toda a necessidade da LIMA defender os interesses e direitos da mulher angolana. Hoje, nos deparamos com situações como, por exemplo, do desemprego. Ainda há muitas mulheres desempregadas. Também encontramos muitas famílias sem abrigo, outras sem uma habitação condigna. De facto, muitas famílias vivem em condições extremamente difíceis, sem energia eléctrica, sem água potável.

Na saúde, temos graves problemas nas maternidades de Luanda, onde não há uma assistência razoável em relação às mães, sobretudo que para lá se deslocam. Nós verificamos que ainda há muita falta de humanização no sector da saúde. Verificamos por exemplo que nas pediatrias dos hospitais de Luanda, há índice elevado de mortalidade infantil. Portanto, são questões que nos preocupam profundamente como organização feminina que tem de velar pelos direitos da mulher.

 

Club-k - Neste caso, o que pretendem fazer para alterar o quadro?

MJ - Nós temos metas a atingir. Nós sabemos que estamos numa fase de preparação para as próximas eleições, em 2012, e queremos envidar esforços no sentido de consolidar a nossa organização para que haja uma participação activa, e efectiva, das mulheres no próximo pleito eleitoral. Portanto, aprimorar a nossa organização para que as mulheres estejam em peso nas mesas das assembleias de voto. Enfim, na sensibilização e consciencialização de todo o povo para votar, para que haja realmente uma mudança significativa no nosso país.

 

Club-k - A LIMA conta com alguma parceria para o efeito?

MJ - Sim! Nós temos parcerias com as outras organizações femininas a nível nacional e internacional. Temos parcerias com a Plataforma de Mulheres em Acção, Rede Mulher, Fórum de Mulher Política, além do ministério da Família e Promoção da Mulher, etc..

 

Club-k - Houve um facto curioso que deixou todos angolanos com a pulga atrás das orelhas, foi quanto a ida do Presidente da República à província do Kuando Kubango, onde apareceram centenas de senhoras da LIMA no aeroporto na sua recepção. Elas, de facto, foram convidadas para o efeito?

MJ - Não sei. Mas foram lá simplesmente para receber o Presidente José Eduardo dos Santos. Porque afinal, ele é o Presidente de todos os angolanos. (risos)   

 

Club-k - É a primeira vez que a vossa organização toma uma atitude de género?

MJ - Não. Já a fizemos noutras províncias.

 

Club-k - Isso quer dizer que já existe uma certa abertura...

MJ - Não. Mas, nós agora temos de forçar. Se nós também somos angolanas e temos o direito de receber o nosso Presidente da República.

 

Club-k – Que avaliação faz do papel da mulher angolana, uma vez que se fala, a nível do Executivo, de um aumento considerável das mesmas para os cargos públicos?

MJ - Eu considero que a mulher angolana no seu percurso histórico, tem estado a conquistar passos positivos. A mulher angolana é corajosa e determinada, no seu geral. Há um envolvimento total das mulheres no sentido de proporcionar melhores condições, no que concerne a defesa dos seus direitos. Há uma representatividade razoável. Não digo excelente, porque ainda não atingimos os 50 por cento como acontece noutros países como, por exemplo, no Ruanda sobretudo, onde as mulheres representam 50% no parlamento.

Há um processo que se vem desenrolando. Já há participação das mulheres no voto, porque nós sabemos que existem países onde as mulheres ainda lutam para conquistar esse direito. Em relação à mulher angolana já é um ganho.

As mulheres angolanas participaram na luta de libertação nacional – isso é inegável –, para o alcance da independência em Angola. Isto é um facto histórico e de grande mérito. Já no processo da democratização, as mulheres também têm estado a participar.

Conforme eu dizia, esta luta da mulher angolana para a igualdade de direitos e oportunidades, é um processo que se tem estado a desenrolar e que precisa encontrar patamares mais aceitáveis.

 

Club-k - O quê que, pessoalmente, a senhora tem feito para mudar este reflexo...?

MJ - Considero-me como uma activista dos direitos da mulher. Para mim, eu acho que a participação das mulheres na vida pública e política já é um ganho. E posso dizer que a nível do nosso partido, a mulher na UNITA alcançou, realmente, posições bastante significativas. Nós temos mulheres a nível da direcção do partido, no Comité Permanente, na Comissão Política e no Parlamento. Portanto, isto é um ganho e é um processo que tem registado passos positivos. Nós iniciamos está caminhada e vamos continuar até alcançarmos os objectivos traçados pelas Nações Unidas e a SADC.

 

Club-k - Mudando de assunto, acho que a intolerância política não tem deixado de fora as militantes da LIMA?

MJ - Realmente é de lamentar que no nosso país ainda – quando estamos num processo democrático – se verifiquem actos de intolerância política. Esta questão é um facto. Eu sei que há pessoas, em alguns círculos, que não gostam. Pensam que a UNITA utiliza termos bombásticos para falar da intolerância política. Não é. São factos reais.

Quando nós dissemos que temos uma senhora Maria da Conceição que foi morta, em Luanda, por ser membro da LIMA, isso é um facto. Não é nenhuma invenção. Quando nós dissemos que temos uma Paulina Chinossole, no Huambo, que em Agosto do ano passado foi morta quando regressava da lavra porque trazia a camisola da UNITA, isso é um facto. Quando dissemos que temos uma Beatriz que lhe foi amputada a perna, está no Bailundo, é um facto. Por isso é que a questão da intolerância política deve ser bem vista se quisermos falar de uma verdadeira reconciliação nacional.

 

Club-k - ...uma estratégia de intimidação por parte dos seus praticantes...?

MJ - É tudo uma estratégia de medo. Portanto, quando o MPLA envereda pela estratégia do medo é porque não está seguro das suas posições. Nós estamos numa democracia multipartidária pela qual, a UNITA sempre se debateu desde a sua fundação.

Democracia multipartidária, isto significa que os vários partidos políticos devem desenvolver as suas actividades e, não haver esta diferenciação de um partido ter mais direitos que outros. Um partido tem mais tempo de antena que os outros. Tudo isso revela a tal intolerância política.

Portanto, todos os partidos políticos têm direito de desenvolver as suas actividades. Mesmo as bandeiras dos partidos políticos devem ser hasteadas onde se encontram os seus membros. Porque não? Essa política de medo é que nós temos de combater. Não podemos aceitar que continuemos nesta política.

Como é que nós vamos construir Angola? Angola tem de ser construída com todos os seus filhos. Quer sejam da UNITA, do MPLA, da FNLA, do PRS, etc., de todos os credos religiosos existentes aqui em Angola, de todas as raças. Isto é que é Angola. É um mosaico. Portanto, nós não podemos ter uma Angola de divisões e excepções. Não. Tem de ser uma Angola onde os angolanos se sintam verdadeiramente na sua terra.

O Dr. Savimbi dizia: 1º o angolano, 2º o  angolano, 3º o  angolano e o angolano sempre. E o Dr. Savimbi definiu quem é o angolano. Foi ele o primeiro a dar a verdadeira definição de quem é angolano. Porque Angola é um mosaico cultural, onde várias raças estão representadas. É preciso que, os governantes tenham em consideração a questão do cidadão. Os cidadãos angolanos têm os seus direitos salvaguardados. Quando os cidadãos vão aos hospitais e não são bem atendidos e assistidos, então o governo está ao serviço de quem?

 

Club-k - Existe ou não, uma certa rivalidade entre a LIMA e a OMA, as duas maiores organizações femininas partidárias do país?

MJ - (Risos) Eu não gostaria de seguir nesta linha de pensamento. A LIMA é uma organização feminina de um partido político que é a UNITA e a OMA é do partido político MPLA. São as duas mais destacadas em termos de questões de defesa dos direitos das mulheres, nós temos pontos comuns. Nós temos, por exemplo, a questão da representatividade da mulher. São pontos comuns. Temos a questão da participação da mulher na vida política e pública, na representatividade no governo. Esses são interesses comuns.   

Eu acho que as duas organizações devem trabalhar muito no sentido de salvaguardar a paz. No sentido de salvaguardar a reconciliação e a reconstrução nacional, porque quando se desenrolou o conflito as mulheres foram às maiores vítimas. Hoje, nós temos muitas mulheres que são chefes de família, porque perderam os seus maridos. As mulheres da OMA deviam trabalhar, realmente, no sentido de salvaguardar a paz e a reconciliação nacional. E não pela intolerância política.

 

Club-k - Refere-se as agressões físicas praticadas pelas senhoras da OMA contra as da LIMA, principalmente nas províncias?

MJ - Exactamente. Elas são instrumentalizadas. As mulheres da OMA não deviam aceitar serem instrumentalizadas para irem contra as suas irmãs da LIMA. As mulheres têm de trabalhar no sentido de salvaguardar a paz.

Porque a paz que hoje temos em Angola ainda não é genuína. É uma paz fictícia porque ainda há intolerância política. Há política do medo que o MPLA quer incutir nas pessoas. A minha mensagem para as senhoras da OMA é no sentido de contribuírem para que estes actos de intolerância terminem, para que as mulheres possam realmente estar unidas. Porque as mulheres sofreram muito ao longo dos anos.

 

Club-k - Por outro lado, circulam informações que há muitas senhoras a fugirem da LIMA para OMA?

MJ - Devo-lhe dizer que esta questão de movimento de pessoas de um partido para o outro é meio complicado. Tanto há membros da OMA que vêm para LIMA. Temos factos e vice-versa. Isto só revela, portanto, em relação ao nosso partido, a democratização que existe. Nós não podemos forçar ninguém a ficar com conosco. As pessoas são livres de escolherem o partido que acharem que lhes convém.

 

Club-k - Há também quem diz que actualmente a LIMA tem menos militantes que nos anos anteriores...?

MJ - Eu não vou por ai que a LIMA tem menos militantes hoje do que no passado. Não. É um processo evoluitivo. Portanto, estamos a conquistar cada vez mais. Conforme lhe disse, há membros da OMA que estão a vir para LIMA. Então, isso não são ganhos?

 

Club-k - É um número insignificante...

MJ - Nem pensar. São muito mais que pensas. O senhor vai verificar hoje que a LIMA não é um punhado de mulheres.

 

Club-k - Mais quantos militantes tem, neste exacto momento, a LIMA?

MJ - Neste momento não lhe vou dizer exactamente o número, porque conforme sabe nós estamos num processo de recenseamento de novos efectivos. Por isso, não lhe vou adiantar para não errar.

 

Club-k - Mudando outra vez de assunto, para quando o próximo congresso da LIMA, uma vez que o seu mandato está prestes a findar, segundo os vossos estatutos?

MJ - Com certeza. O senhor sabe que a reunião da Comissão Política vai definir todos os parâmetros em termos do congresso do partido e consequentemente da LIMA. Porque, normalmente o congresso da LIMA vem depois do congresso do partido, nesta altura nós anunciaremos.

 

Club-k - A senhora voltará a concorrer para a sua reeleição... ?

MJ - Oportunamente o senhor saberá.

 

Club-k - Quer dizer que é um sim?

MJ - Não estou afirmar. Simplesmente estou a dizer que, oportunamente saberás o que se vai passar sobre o congresso da LIMA.

 

Club-k - A senhora esta preparada para abandonar a cadeira do presidente e ficar com uma simples militante de base?

MJ - Com certeza. Se estou preparada? Sim! Então isso não é democracia? É democracia... (risos). Mas porque que não estou preparada se a LIMA não é só a Miraldina. A LIMA tem muitos quadros capazes e, ao longo destes anos que estive a frente da LIMA outros quadros foram se capacitando. Digo isso com muito orgulho que a LIMA não é só a Miraldina, a LIMA tem muitos membros capazes de estar a frente da organização.

 

Club-k - Qual será o papel da LIMA nas próximas eleições?

MJ - O nosso papel será de consciencializar as mulheres para participarem no processo eleitoral. Nós sabemos que as mulheres são a maioria na nossa sociedade, e achamos que as mulheres da LIMA devem envolver-se activamente para podermos salvaguardar o voto.

E também, para que possamos minimizar a fraude. Porque sempre que há eleições, há fraude. É preciso salvaguardar isso, para que seja um processo transparente. Então é preciso envolvimento de toda a gente. Penso que, as mulheres podem desempenhar um papel muito importante neste sentido, através das suas presenças nas assembleias de votos como fiscais.